Hoje li uma
história que acho muito pertinente para os dias atuais, pois parece que temos o
tempo todo que alimentar as nossas carências...
Carências tenho
aos montes!!! Mas não é por causa destas faltas que não aproveito as 99 moedas
que tenho.
O budismo fala disso! Fala sobre a
carência que causa o desejo, desejo esse que nos causa sofrimento — justamente
pela satisfação muitas vezes momentânea.
Isso não quer dizer que a gente não deva ter desejos
ou ambições, acho que isto é básico no ser humano. Mas, devemos ter consciência
de que sempre haverá falta e perdas. A moeda que falta é A coisa que nos faz
ter a esperança e que nos causa dor. As
99 moedas é o que se tem aqui e agora e muitas vezes nem percebemos e são com elas que contamos nos momentos de dor e alegria. Esta
história é uma grande metáfora da vida. Pôooo!!! Sejamos como o pajem antes de
ganhar as moedas. Saibamos aproveitar os nossos dias com o que temos e saibamos nos aceitarmos como somos.
“Você, Eu e todos ao redor fomos
educados nessa psicologia: sempre falta algo para estarmos completos, e somente
completos podemos gozar do que temos. Portanto, nos ensinaram que a Felicidade
deve esperar até estar completa com aquilo que falta. E como sempre falta algo,
a ideia volta ao início e nunca se pode desfrutar plenamente da vida.
Mas, o que aconteceria se a Iluminação chegasse às
nossas vidas e nos déssemos conta, assim, de repente, que nossas 99 moedas são
os nossos 100%? Que nada nos faz falta? Que não se é mais feliz por ter 100 e não 99 moedas? ”
Círculo dos 99
Era uma vez um Rei muito triste; que tinha um pajem, que como
todo pajem de um Rei triste, era muito feliz. Todas as manhãs, o pajem chegava
com o desjejum do seu Amo, sempre rindo e cantarolando alegres canções. O
sorriso sempre desenhado em seu rosto, e a atitude para com a vida sempre
serena e alegre. Um dia o Rei mandou chamá-lo:
— Pajem - disse o Rei -
qual é o seu segredo?
— Qual segredo, Alteza?
— Qual o segredo da tua
alegria?
— Não existe nenhum
segredo, Majestade.
— Não minta, pajem...bem
sabes que já mandei cortar muitas cabeças por ofensas menores do que a sua
mentira!
— Mas não estou mentindo!
Não guardo nenhum segredo.
— E por que estás sempre
alegre e feliz?
— Majestade, eu não tenho
razões para estar triste: muito me honra servir à Vossa Alteza, tenho minha
esposa e meus filhos, e vivemos na casa que a Corte nos concedeu; somos
vestidos e alimentados, e sempre recebo algumas moedas de prata para satisfazer
alguns gostos... como não estar feliz?
— Se você não me disser
agora mesmo qual é o seu segredo, mandarei decapitá-lo - disse o Rei. Ninguém
pode ser feliz por essas razões que você me deu!
— Mas Majestade, não há
nenhum segredo... Nada me satisfaria mais do que sanar a Vossa curiosidade, mas
realmente não há nada que eu esteja escondendo.
— Vá embora daqui antes que
eu chame os guardas.
O pajem sorriu, fez a
habitual reverência e deixou o Rei em seus pensamentos. O Rei estava como
louco. Não podia entender como o pajem poderia ser feliz vivendo em uma casa
que não lhe pertencia, usando roupas de terceira mão e se alimentando dos
restos dos cortesãos. Quando se acalmou mandou chamar o mais sábio de seus
conselheiros, e lhe contou a conversa que tivera com o pajem pela manhã.
— Sábio, por que ele é
feliz?
— Ah, Majestade! O que
acontece é que ele está fora do Círculo...
— Fora do Círculo?
— Sim.
— E é isso o que faz dele
uma pessoa feliz?
— Não, Majestade. Isso é o
que não o faz infeliz...
— Vejamos se entendo: estar
no Círculo sempre nos faz infelizes?
— Exato
— E como ele saiu desse tal
Círculo?
— Ele nunca entrou.
— Nunca entrou? Mas que
Círculo é esse?
— É o Círculo dos 99...
— Realmente não entendo
nada do que você me diz.
— A única maneira para que
Vossa Alteza entenda seria mostrando pelos fatos.
— Como?
— Fazendo com que ele entre
no Círculo.
— Isso! Então o obrigarei a
entrar!
— Não, Alteza, ninguém pode
ser obrigado a entrar...
— Então teremos que
enganá-lo?
— Não será necessário... se
lhe dermos a oportunidade, ele entrará por si mesmo.
— Por si mesmo? Mas ele não
notará que isso acarretará sua infelicidade?
— Sim, mas mesmo assim
entrará... Não poderá evitar!
— Me diz que ele saberá que
isso será o passo para a infelicidade e que mesmo assim entrará?
— Sim. O senhor está
disposto a perder um excelente pajem para compreender a estrutura do Círculo?
-Sim.
— Então nesta noite
passarei a buscar-lhe. Deves ter preparada uma bolsa de couro com 99 moedas de
ouro. Mas devem ser exatas 99, nem uma a mais, nem uma a menos.
— O que mais? Devo levar
escolta para proteger-nos?
— Nada mais do que a bolsa
de couro, Majestade...
— Então vá. Nos vemos à
noite.
Assim foi... Nessa noite o
sábio buscou o Rei e juntos foram até os pátios do Palácio. Se esconderam
próximo à casa do pajem, e lá aguardaram o primeiro sinal. Quando dentro da
casa se acendeu a primeira vela, o sábio pegou a bolsa de couro e junto a ela
atou um papel que dizia as seguintes palavras: "Este tesouro é teu. É o
prêmio por ser um bom homem. Aproveite e não conte a ninguém como encontrou
esta bolsa". Logo deixou a bolsa com o bilhete na porta da pajem. Golpeou
uma vez e correu para esconder-se. Quando o pajem abriu a porta, o sábio e o
Rei espiavam por entre as árvores para verem o que aconteceria. O pajem viu o
embrulho à sua porta, olhou para os lados, leu o papel, agitou a bolsa e, ao
escutar o som metálico, estremeceu dos pés à cabeça, apertou a bolsa contra o
peito e rapidamente entrou em sua casa. O Rei e o sábio se aproximaram então da
janela para presenciar a cena. O pajem havia despejado todo o conteúdo da bolsa
sobre a mesa, deixando somente a vela para iluminar. Havia se sentado e seus
olhos não podiam crer no que estavam vendo...Era uma montanha de moedas de
ouro! Ele, que nunca havia tocado em uma dessas, de repente tinha um mote
delas...Ele as tocava e amontoava, acariciava e fazia brilhar à luz da vela.
Juntava e esparramava, fazendo pilhas... E assim, brincando, começou a fazer
pilhas de 10 moedas. Uma, duas, três, 4, 5.... e enquanto isso somava 10, 20,
30, 40, 50... até que formou a última pilha... 99 moedas? Seu olhar percorreu a
mesa primeiro, buscando uma moeda a mais, logo o chão e finalmente a bolsa.
"Não pode ser" . pensou. Pôs a última pilha ao lado das outras 9 e
notou que realmente esta era mais baixa.
— Me roubaram! Me roubaram
. gritou. Uma vez mais procurou por todos os cantos, mas não encontrou o que
achava estar faltando...Sobre a mesa, como que zombando dele, uma montanha
resplandecia e lhe fazia lembrar que haviam SOMENTE 99 moedas."99
moedas... é muito dinheiro" . pensou.
— "Mas falta uma...
Noventa e nove não é um número completo. 100 é, mas 99 não..."
O Rei e o sábio espiavam
pela janela e viam que a cara do pajem já não era mais a mesma: ele estava com
as sobrancelhas franzidas, a testa enrugada, os olhos pequenos e o olhar
perdido... sua boca era uma enorme fenda, por onde apareciam os dentes que
rangiam. O pajem guardou as moedas na bolsa, jogou o papel na lareira e olhando
para todos os lados e constatar que ninguém havia presenciado a cena, escondeu
a bolsa por entre a lenha. Pegou papel e pena e sentou-se a calcular. Quanto
tempo teria que economizar para poder obter a moeda de número 100? O tempo todo
o pajem falava em voz alta, sozinho...Estava disposto a trabalhar duro até
conseguir. Depois, quem sabe, não precisaria mais trabalhar... com 100 moedas
de ouro ninguém precisa trabalhar. Finalizou os cálculos. Se trabalhasse e
economizasse seu salário e mais algum extra que recebesse, em 11 ou 12 anos
conseguiria o necessário para comprar a última moeda." Mas 12 anos é tempo
demais... Se eu pedisse à minha esposa que procurasse um emprego no vilarejo, e
se eu mesmo trabalhasse à noite, em 7 anos conseguiríamos" - concluiu
depois de refazer os cálculos.
"Mesmo sendo muito
tempo, é isso o que teremos que fazer..."
O Rei e o sábio voltaram ao
Palácio. Finalmente o pajem havia entrado para o Círculo dos 99!!! Durante os
meses seguintes, o pajem seguiu seus planos conforme havia decidido naquela
noite. Numa manhã, entrou nos aposentos reais com passos fortes, batendo nas
portas, rangendo dentes e bufando com todo o mau humor típico dos últimos
tempos...
— O que lhe acontece,
pajem? - perguntou o Rei de bom grado.
— Nada, não acontece
nada...
— Antigamente, não faz
muito, você ria e cantava o tempo todo...
— Faço ou não o meu trabalho?
O que Vossa Alteza esperava? Que além de pajem sou obrigado a estar sempre bem
por que assim o deseja?
Não se passou muito e o Rei
despediu o seu pajem, afinal, não era nada agradável para um Rei triste ter um
pajem mau humorado o tempo todo...
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