terça-feira, 14 de maio de 2019

GIBRAN: A DOR


Mais uma vez Gibran nos surpreende, porque nós sempre esperamos da DOR uma associação necessária com algo negativo e  ele já começa negando categoricamente isso. Ele coloca a dor como uma das coisas mais positivas que temos na vida. A gente só vai entender isso se trocarmos a nossa lógica de vida, o nosso sentido de vida.

No nosso sentido de vida Moderno, felicidade está associada ao prazer. Para pensadores clássicos, e Gibran se inscreve nessa linha de pensamento; o sentido da vida está no crescimento, então o que é bom, não é o que é agradável para você, mas o que te faz crescer. Se algo te faz crescer, isto é tremendamente positivo, ainda que não tivesse sido agradável. Essa associação que fazemos do bom com o agradável, é terrível!

Sempre se definiu à formação de caráter como ensinar o homem a gostar dp bem e rejeitar o mal. Como nós não recebemos essa formação de caráter, nós gostamos de muitas coisas que são péssimas para o nosso crescimento, então o nosso bem não tem nada a ver com o que é agradável para nós. Então é curiosos como a gente percebe isto nas palavras. A maneira como nós nos cumprimentamos hoje em dia, é um exemplo. Se você for observar ao longo da história, quando você é apresentado a uma nova pessoa, em geral, a civilização reserva uma palavra muito especial para este momento.

É um desejo que você está expressando para aquela pessoa, os melhores desejos por ela, que  para aquela pessoa, os melhores desejos por ela, que no momento entra na sua vida. Você percebe em civilizações como a India -Namastê ao divino( o Deus que há em mim saúda o Deus que há em ti); em Roma - Ave- ao Sagrado; entre os árabes –as salom alaykon – que a paz esteja com você; entre os Incas –ama sua, ama llulla, ama quella- não sejas mentirosos, não sejas ladrão, não sejas ocioso... Imagina, toda vez que você conhece alguém dizer isto? É uma autodisciplina por repetição.  Porque a partir do momento que você pensar em ser mentiroso, vai ter um choque de tanto que se repete isto. Este momento de cumprimentar, é um momento muito especial dentro da linguagem  em todas as civilizações do mundo. Hoje quando você é apresentado a uma pessoa nova, você diz: “ muito prazer em conhecer”, ou seja, o que eu tenho mais sagrado, nobre e divino, eu desejo a você. E o que é isto? “O Prazer”.

Então, a felicidade é o prazer; a dor é o diabo. Não poderia ser outra coisa. Percebem que tem um ditado popular que diz: “a necessidade é quem ensina o sapo a pular”, ou seja, as necessidades estão associadas a algo pedagógico: em duas gerações perdemos isto.

Hoje as dificuldades é algo que você tem de se poupar dela a qualquer preço, porque a felicidade está diretamente associada ao prazer.

Então, dentro de uma sociedade onde a tônica não é crescer, mas ficar confortável, não é incomum quando você tenha qualquer tipo de dor e procure ajuda, essas pessoas querem te ajudar a se libertar da dor e não a crescer através dela.

Se seu percebo que você tem uma dor psicológica dentro de umas certas abordagens de certas terapias, eu quero libertar você dessa dor e não ajudar a você a passar através dessa dor.

Muitas vezes você transfere a responsabilidade da dor para um fator externo, que pode causar um certo alívio, mas tira qualquer possibilidade de ação.

Se eu acho um culpado para minha dor, quem tem de mudar é ele, não eu. Imaginem que alguém colocou a mão na parede e fez uma sujeira, aí eu pergunto: “quem foi” busco procurar as causas. Então descubro e não faço nada para limpar. Deixa essa sujeira aí, enquanto alguns dizem: “nossa, como está feio.” Então falamos: “Foi Fulano”. Achamos o culpado e nos acomodamos, ou seja, nem sempre crescer está associado exclusivamente à análise voltada para o passado. Quando você descobre as causas de um problema e não está imbuído de vontade de crescer, você pode tomar nesta causa um comodismo, já achei um culpado e me acomodo.

Vontade de crescer está mais baseada em síntese voltada para o futuro , do que em análise voltada passado. Se não há esta síntese voltada para o futuro, não há reação. Não importa como eu entrei neste problema, o que importa é que irei sair...chegar lá... por quê?  Porque quero. E se necessito das causa para sair, a Natureza se encarrega de trazê-las à tona no meu consciente. Porque a Natureza trabalha isto.

É um conceito yunguiano que é a sincronicidade, quando você alavanca na direção do crescimento como ser humano, a natureza se movimenta para te trazer as ferramentas que você precisa. Os contos de fada retratam bem isto. O príncipe diz: “Vou salvar a princesa do dragão, da bruxa” é um obstáculo descomunal e ele é só um rapazinho, mas a determinação dele é tão nobre que ele no caminho vai encontrando as armas mágicas: uma capa que o torna invisível, uma espada que tem poderes, um escudo, ou seja, vão aflorando seus poderes latentes. Vão aflorando os elementos que ele necessita saber para chegar lá e ter vitória.

Por quê? Porque ele se movimentou. A projeção da vontade humana traz à tona as ferramentas que necessitamos. E se não há esta vontade...

Tem um provérbio muito antigo que diz: “ O homem entra no problema por diversas vias e você só sai por uma, que é a vontade. (Determinação, vontade e garra, é o que vai te tirar de um problema).

A dor é um veículo de consciência, segundo a filosofia budista.

Ficar detido pela dor é morbidez.

Imagine que o prof. De Matemática dá ao seu filho uma operação-problema, logo, ele tem de resolvê-la. Ele não tem de ficar detido pela operação; aí começa a vitimização e todos os vícios que se tem na sociedade...

Já percebeu uma coisa interessante: Se a dor, se você permanecesse dentro dela, você crescesse... Todas as pessoas que sofrem no mundo seriam sábias. Não é a dor em si, mas a maneira como você lida com ela; é a disposição de entrar nela e sair do outro lado maior.

A preocupação do Buda era que a dor tivesse uma solução, um novo sentido, levasse o homem a algo mais permanente. O paradoxo dele perder todas as coisas dos quais ele estava apegado, gerasse nele um ato de consciência para buscar aquilo que ele não pode perder. Se não gera, é um masoquismo.

Cada ano da sua vida você está mais próximo de perder tudo, e não tem nenhuma compensação? Não tem nada?

Cada dia estou mais próximo de perder tudo. E o que ganho? Nada? É desesperador.

A dor é um elemento para incentivar o salto da consciência (permanecer dentro dela não é sadio).

Nós podemos perceber isto, pois nem todo mundo que sofre fica mais sábio por isso. Ela convida a crescer, não obriga. Ninguém obrigou o homem a crescer.

Alguns que permanecem dentro dela ficam revoltados, cheio de ódio, piores do que eram antes. E transferem a responsabilidade para Deus. Então Gibran vai começar um fato curioso. Observe a relação que existe entre quem pergunta e aquilo  que é perguntado.



                                              Uma mulher disse: - Fala-nos da dor.



Existe uma associação clássica da mulher com este elemento de suportar a dor, porque é fato.

O homem tem uma energia de impulso, de explosão; enquanto a mulher tem uma energia de permanência. Ela tem uma capacidade de suportabilidade de dor por um período muito mais longo, que a própria medicina fala sobre isto. A mulher suporta situações psicológicas às vezes por uma vida inteira que seriam insuportáveis para o homem. Esta capacidade de dor/ Fé sempre foi um arquétipo ligado ao feminino. Esse campo energético; ela tem uma energia de resistência.



                      E  ele respondeu:

                     -A vossa dor é o quebrar da concha

                      que envolve a vossa compreensão.



Evoluímos em geral no sistema de escada, se não houver dentro de nós um obstáculo, a nossa tendência é permanecer no mesmo patamar eternamente.

Às vezes a dor se torna insuportável, e aí começamos a bater, bater...até observarmos que há uma solução acima.

Nós sabemos que necessitamos dos obstáculos, pois os obstáculos vão fortalecendo  a nossa resistência tanto física quanto psicológica. A dor entra como elemento para quebrar este patamar de experiência e te proporcionar outro patamar.

Mas o homem tem de se perguntar: O que a vida está querendo me dizer com isto?

A partir do momento que você admite (Platão fala sobre isto) que uma situação não tem nada para te ensinar, e que é injusta, você vai começar um processo de sofrimento.

Ele dizia: “Todas as leis devem ter um longo preâmbulo explicativo. Os homens têm  de compreender que as leis não existem para puni-los. Se o homem coloca na sua cabeça: “Isto é injustiça”, não vai aprender com isto. Ele entra no processo de sofrimento onde não cresce nada.

A dor não é casual, não foi provocada por terceiro, ela foi provocada pela tua necessidade de crescer. Como se cada um de nós viéssemos ao mundo com um cartão cifrado, com uma necessidade de experiência para viver aquilo.

A necessidade de experiência vai trazer obstáculos que vão te fazer superar aqueles elementos que você precisa superar. Você atraiu, por quê? Pelo teu poder pessoal. Pela tua necessidade de experiência.

Cuidado, uma pessoa que tem uma vida muito cômoda e sem obstáculos, isto do ponto de vista clássico, não seria digna de inveja. É talvez uma pessoa tão frágil, que a vida não vai tentar testá-la porque não irá ter respostas. E as leis da vida não são sádicas. Elas não querem torturar ninguém, mas querem dar uma oportunidade de crescer.



                               Como a semente da fruta deve se quebrar

                               para que seu coração apareça ante o Sol,

                               assim também deveis conhecer a dor.



Tentem imaginar uma semente dentro de uma casca, dentro de uma camada de terra e a vida querendo expandir...rompendo...expandindo...quebrando esta casca, quebrando a resistência da terra...

Vocês já viram plantas que nascem numa brecha doa asfalto? Quebrando a resistência e procurando a luz...

Agora tentem imaginar um ninho de Galáxias, a mesma força vital, expandindo...quebrando resistência, quebrando a atração da lei da gravidade, expandindo...procurando ganhar cada vez mais espaço... Vocês percebem que esta mesma força existe dentro de nós?

Uma necessidade da vida, expandir!!! Uma necessidade de buscar mais luz, de se ampliar. Não ampliar fisicamente, mas de se ampliar humanamente. Sermos mais humanos. Expandirmos a fronteira da nossa consciência. O mesmo impulso da semente, do ninho de Galáxias existe dentro de nós. É a vida sufocada, a alma prisioneira querendo ganhar espaço, quebrar os seus limites, então isto pode aparecer doloroso, porque quando estamos apegados a um limite, perde-lo é como se perdêssemos um pedaço de nós.

Estou tão apegado a esta preguiça, se eu perdê-la é como se fosse um braço que eu perdi. Tenho uma afinidade psicológica com as minhas limitações e sofro quando as perco, como se eu tivesse sendo mutilada. Aquele clássico Indu, que é o Bhagavadgita, fala exatamente disso: é a luta entre os vossos defeitos e as nossas virtudes; e Juna que é o herói chorando pelos defeitos que ele está derrotando. Por quê? Pela familiaridade que desenvolvemos com isto.

Chegamos ao ponto de quando uma pessoa pergunta: Como você é? Você fala dos seus defeitos. Você não é os seus defeitos; você está. É um verniz no qual você  tem de se livrar. Não se defina pelos seus defeitos. Os defeitos não fazem parte da nossa essência. Não existe essência defeituosa, foi um elemento que se agregou. Se você define isto como parte de você  é muito difícil se libertar, porque aí vem a dor.



                Se vossos corações pudessem se manter sempre maravilhados

                com o milagre diário de vossas vidas,

                vossa dor não vos pareceria menos maravilhosa que vossa alegria.



Imaginem vocês passando por uma situação dolorosa, difícil, mas você consegue atravessar isto e chegar num outro patamar de consciência, quando você olha para trás  e ver que aquilo te permitiu crescer como ser humano, que permitiu servir melhor  a humanidade, que não está aqui para viver em vão.

No momento em que você sintetizou e integrou bem esta experiência, é o momento em que você olha para trás e diz: “pelo que cresci, não foi caro, foi um bom preço, valeu!!!” Endentem? Pelo que me permitiu crescer e ser bem melhor como ser humano, não foi caro. Observamos a Natureza, a semente morre debaixo da terra para que a planta nasça. E depois que a planta dá os seus frutos, seca e ela perde totalmente suas folhas e volta a nascer. Isto é o ciclo da Natureza. O problema é que nós não nos consideramos como ciclo da Natureza; Também com ciclos, com necessidade de deixar folhas para trás para que renasçam; porque tudo é um processo de renascimento. Mas neste processo, alguma coisa morre para outra renascer.

Assim são as leis da Física, dois seres ocupam o mesmo lugar no espaço, e algo veio à luz e algo morreu.

Sabemos que àquilo que é realmente nosso, não pode ser tirado de nós, então se compreendêssemos isto, tiraríamos o medo. Se foi, era porque não era meu. Se as coisas se vão, vai me deixar mais puro. Eu estarei mais perto de saber e ver o que realmente sou.

Quais são os elementos temporários e o que é aquilo que realmente sou.  Por isso que a obra de Platão e vários outros clássicos falam: “ que a nossa identidade deveria ser definida em cima das virtudes que queremos ter. Ainda que não vejamos quem somos nós . Somos justiça, somos fraternidade, somos bem.  Teu nome interno está no horizonte, ou seja, o teu ideal está mais próximo de ser você do que as tuas características da tua personalidade no dia de hoje. Se você se identifica com o teu rosto no espelho, vai sofrer, porque muita coisa vai ser deixada pelo caminho, e é bom que seja deixado. É bom deixar fluir à vida, é bom deixar que as folhas caiam. Elas não fazem parte da nossa essência, da nossa identidade.

Às vezes eu falo para uma pessoa: “você precisa depurar o seu rosto”; este hábito de gostar de certos padrões mentais, não é bom para você.” Então a pessoa questiona:  “Como assim? Se eu deixar de gostar disso, vou deixar de ser eu, isso é minha identidade.”

Que definição de identidade superficial você tem. Às vezes, hábitos sociais, circunstanciais..e acham que a sua identidade está associada com a comida, os locais que frequentam. Se você tivesse nascido do outro lado do mundo, gostaria de outras coisas e não deixaria de ser você.

Nós hoje estamos tão superficiais na nossa identificação que chega a ser curioso. Então, se eu deixar de comer algo, não sou eu, me mutilei. Que identidade superficial!

Aquilo que podemos perder significa que nunca foi nosso.  Porque muitas vezes não fomos nós que escolhemos. Fomos moldados pelas circunstâncias. Quantos de nós fomos escolhidos por nós? Dos nossos hábitos, gostos... Quantos dos nossos gostos foram determinados pelo meio?

Então perder o medo e saber que àquilo que você é não pode ser tirado. É fundamental para chegar do outro lado da dor sem medo. Que ela te mutile. Como vai te mutilar?

Aquilo que eu sou não vai deixar de ser.

Percebam que tem muitos elementos de cultura, elementos estranhos de valores que fazem com que a gente tenha as posturas que tem diante da dor.

Para você ter uma postura diferente, precisaria de ter um ideal de vida diferente: não fundamentada no prazer, mas no ser: precisaria de uma identidade mais profunda. Muitas coisas, muitos elementos teriam de ser reconstruídos.

A tradição grega dizia que você só entenderia  os deuses do Olimpo se entendesse os cânones sagrados; se você não entende as leis, você não entende os deuses; ou seja, perdemos os cânones da vida, parâmetros humanos de vida, aí os valores ficam todos atrapalhados. Por exemplo, a avaliação da dor é um desastre.



                               E aceitaríeis as estações de vosso coração,

                             como sempre aceitastes as estações

                             que passam sobre os vossos campos.

                             E esperaríeis com serenidade

                             os invernos de vossa aflição.



Ou seja, no momento em que a vida se recolhe, eu também me recolheria. Na tradição budista e outras, quando vinha o inverno, era o momento em que eles se recolhiam para redigir os textos sagrados. É um momento para isto: para a vida interior já que a vida exterior se reduziu. É um momento de encontro com a sua alma para você semear algo quando vir a primavera/ verão ter o que oferecer ao mundo.

Se eu não semeio nada, eu saio para a primavera/ verão de mãos vazias. Se você não tem este momento, você não tem nada para dar a ninguém, está vazio.

Então é um momento de reflexão, porque a vida física se reduz ao mínimo, e a metafísica, ao máximo.

Veja que os grandes mestres nascem aí, é o Natal. Porque é um momento de nascer algo muito espiritual também dentro do homem.

O homem tem de saber andar junto com a Natureza, aproveitando a energia que ela lhe dá.

Em relação à administração do tempo é uma briga para convencer as pessoas porque eles têm de respeitar a sua Natureza para trabalhar, para estudar. Se você tem de ler um livro muito delicado, não ponha esta leitura depois do almoço, porque você não vai conseguir. As pessoas não entendem as coisas básicas hoje em dia. Não dá para brigar com a Natureza. Temso de respeitar o ciclo dela e caminhar de mãos dadas. A Natureza tem uma lógica: tem um momento ideal para estudar, tem um momento ideal para parar de refletir.

Têm os ciclos do dia, e os ciclos da semana e os ciclos do mês. Não briguem contra isto, caminhem com eles. Com a Natureza temos muita força, contra ela, nada; porque também somos parte da Natureza. Estar contra ela é estar contra nós mesmos.

Não brigue com os invernos, quando a vida se recolhe, quando aparece que as oportunidades se fecharam, talvez seja o momento de você entrar e fazer um balanço de tudo isto e ver o que será a partir de agora: renovar, renascer.

Como a Natureza faz: RENASCE!!!!

Os ciclos são: recolhimento e expansão. Faça isto também: aprenda a recolher-se e aprenda a expandir. A gente briga com a Natureza em tudo, até mesmo as idades da vida. A  gente acha que a única idade que tem sentido é a juventude. A infância é um compasso de espera monótono e chato, então invadem a infância com uma adolescência prematura.

A maturidade e a velhice não servem para nada, aí querem estender indefinidamente a juventude. Todas as estações da vida têm algo  e nós devemos aprender a conviver com todas, sabendo que a Natureza não é a causa, é cosmos. Ela tem um propósito em tudo que faz. Não vamos brigar contra ela. Em tudo fazemos isto.



                                      Muitas de vossas dores

                                      vós mesmos as escolhestes.

                                      É o remédio mais amargo com o qual

                                      vosso médico interior cura o vosso Eu doente.



Chega um determinado limite que você necessita desse medicamento para extirpar um determinado patamar de consciência que se você continuar nele, talvez caísse num abismo; chegasse a um nível de contradição que a vida não pudesse fluir mais.

É o que no oriente se chama lei do karma. Às vezes como somos mais conscientes e temos uma reflexão cotidiana sobre a nossa vida, podemos chegar a lembrar o momento onde geramos  a necessidade de estar vivendo essa situação. Esse padrão mental que eu tive, essa resposta da vida aqui, gerou a necessidade de viver isto. Faz sentido. Você junta as duas pontas da vida. Newton em relação à Natureza física, já falava sobre causa e efeito. Você acha que a metafísica não faz parte dessas lei? A vida humana também faz parte dessa lei. A necessidade de experiência vai fazer com que a Natureza me traga as provas para que eu viva essa experiência. A Natureza trama para a evolução do homem. Se você estiver muito atento, você vai perceber claramente aonde foi que você gerou essa necessidade de experiência, para agora a Natureza te trazer conforme o que você pediu, de maneira justa. E não para te punir, mas para te corrigir.

O karma, segundo a tradição oriental, não é vingativo, ele é pedagógico. Aliás, a vingança é considerada imoral em todos os temas filosóficos. Nós vamos ver que a medicina chinesa já falava sobre as doenças psicossomáticas.   







Um médico ocidental falou recentemente sobre a incidência de problemas cardíacos no nosso momento histórico, logo ele falava:  “Olhe, se a medicina oriental estiver razão, o coração é um órgão de impacto de sentimentos negativos, como o ódio. Câncer é um impacto de  posturas negativas, como o egoísmo. Porque uma célula cancerosa é o quê? Uma célula que pensa apenas em si, não no corpo como um todo”. Então, se houver fundamento, isto são impacto de padrões de comportamento mesquinho, que vêm de valores diante da vida. Porque o egoísmo é a ausência de visão de unidade, de um todo. O ódio também é um resultado de valor, em que a existência do outro apaga os meus interesses. Enfim, têm valores por trás desses padrões emocionais. Visões de mundo. Tem toda uma cultura sustentando este tipo de padrão mental, e que vai descendo...tanto que você vai ver quando se falava no passado que havia certas pessoas que sabiam ver o futuro. Não é que elas vissem o futuro, elas viam as coisas indo em planos mais sutis. Ela era capaz de ver o plano emocional de alguém, então ela vai observando em planos mais sutis. É como se em plano mais sutil fosse presente aquilo que o físico vai ser no futuro, entende? É como visse no psíquico, aquilo que no futuro será somático.

E já pode ter uma previsão: em qualquer momento isto vai se precipitar num fato. Não tem jeito: causa e feito. Então, se você considerar dessa forma, a dor é sua aliada. Imaginem se eu não sinto dor em um dente, ele vai apodrecer e eu vou perdê-lo. Não vou ter chance de reagir. É a dor que me avisa: “corrija antes que você perca.”



                             Portanto, confiai no médico e bebei seu remédio

                             em silêncio e tranquilidade,

                             porque sua mão embora pesada e dura,

                             é guiada pela suave mão do invisível.





Confiai no médico. Confiai na lei da vida. É uma coisa básica. Acreditar que a vida é cosmos e não caos.

As experiências não te pegaram por acaso, te pegaram porque você chamou por elas, por necessidade de experiência.

Quando você quer crescer, você precisa da Natureza para trazer provas. É assim em qualquer sistema pedagógico humano. O filho que está no colégio e quer passar de uma série para outra, ele está chamando as provas. Eles vão ter de ser bem sucedidos nelas. E as provas não são suas inimigas. As provas irão promove-lo a um outro patamar de experiência. Se a nossa pedagogia é assim, por que que a da Natureza seja assim?

Se acreditamos que a vida é um processo pedagógico, acontecimentos não são caóticos e por trás dele existe um sentido. Como dizia o Imperador Marco Aurélio: “Nada acontece ao homem que não seja próprio do homem.” A dor vem porque chamamos por ela, porque sentimos necessidade de pular deste patamar para um outro um pouco mais amplo. Então vieram as provas de acesso que nós mesmas chamamos. O homem que não quer crescer, a experiência da dor seria uma tortura. A Natureza irá tentar tencioná-lo até quando ele não aguente mais.

Estava viajando e de repente vejo o Sol se por e estava cheio de raios cravados no horizonte. E era interessante porque aqueles raios vermelhos pareciam rastros de sangue e por um momento me veio um pensamento um pouco poético: todo ser que quer trazer algo de luz ao mundo, parece que fica um pouco de sangue em sua trajetória. Se você quer trazer luz para sua vida, vai ter um custo de dor. Quantas coisas você não deixará para trás? Coisas vão ter de morrer para que outras nasçam e encarar isto de maneira natural é saber distinguir os dois tipos de dor. A dor que você sofre quando não se conforma com as provas da vida, que vai te mutilando... e a dor quando você está deixando coisas para trás e parece que te torna leve. Sofre, mas ao mesmo tempo você percebe que se purifica. A dor mórbida e a dor construtiva.  A dor também tem seus requintes. Há tipo de dor que você fica girando ao redor do mesmo ponto e não sai dali, vai se destruir. E há dores que você percebe que está levantando voos.  Algo ficou para trás Ela perdeu um lastro, um fardo e agora vai ficar mais leve.



                                               E a taça que ele vos dá, embora queime vossos lábios

                                           foi fabricada com a barra que  o Oleiro umedeceu

                                           com suas lágrimas sagradas.



Esse médico divino te dá uma taça para esse fel, e essa taça foi construída com o barro umedecido com as lágrimas do Oleiro sagrado, ou seja, a lei da necessidade do Universo. Aquilo que os orientais chamam de darma, que é o braço de Deus  estendido sobre o colo. O sentido do Universo que está tramando para que todos os seres cresçam e se aproximem da luz. É um pouco dessa oportunidade de te levar adiante.

A dor existe quando existe transmutação. Deve ser desesperador para a lagarta saber o que vai acontecer dentro do casulo. Imagine se nós colocássemos uma consciência humana, nenhuma lagarta viraria borboleta. É desesperador você entrar dentro do casulo, ficar isolado e não saber o que vai acontecer depois. Quantos homens se fossem lagartas virariam borboletas? O medo da transformação. O medo do que virá depois. No fundo se diz que isto é uma falta de confiança na lei da vida, que sempre leva todos aqueles seres que trabalham para ela na direção de criarem asas. Se confiássemos na lei da vida não sofreríamos tanto.

Santo Agostinho quando fala da sua cidade de  Deus, ele diz que: “ a vingança é um tipo de ateísmo inconsciente.”

Toda vez que alguém nos provoca alguma dor, e isto nos provoca ódio ou um sentimento de vingança no fundo nós acreditamos, se nós não fizermos alguma coisa, nada acontecerá porque não existe uma lei no Universo.

De uma certa maneira, ele está falando exatamente o que nós estamos falando. Não existe lei no Universo se eu não atuar, se eu não arregaçar as mangas e não fizer algo. Isto vai ficar impune. Então é um Universo caótico e num Universo caótico, a dor é horrível: “Eu estou sofrendo em vão, eu não vou chegar a lugar nenhum.” Aí causa revolta, injustiça como dizia Platão: “Quando surge esse sentimento, a gente não aprende mais nada.”

Então existem premissas culturais  para que o homem se coloque diante da dor de maneira sadia, que infelizmente hoje são muito raras, mas que estava presente em Gibran e em todos filósofos do passado e por isso consideravam a dor, de uma maneira tão diferente.

Ele a coloca como uma dádiva, como um privilégio, como um ato de confiança na Natureza em relação àquele homem, como se dissesse: “Você pode”. Estou te dando uma oportunidade porque você pode.

É como um professor que não dá ao seu aluno uma prova se não acha que ele tem condições de se sair bem nela e condições de se superar.


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