Crescimento – Renovação – Transmutação
Falar da cobra, ou da serpente não é tarefa fácil. Isto porque há cobras em todo o mundo, em todos os ecossistemas. Onde está o Homem, a cobra acompanha-o, e desde tempos remotos que despertou algo dentro de nós.
Há pelo menos 30 mil anos, que o Homem considera a cobra sagrada. Desde a pré-história que aparece ligada com árvores que crescem, com espirais de movimento, com os rios e riachos que serpenteiam e nos matam a sede, com o falo que fertiliza a fêmea e com todas as formas ondulantes e fluidas que criam e regeneram a vida.
A força da natureza que emana destas formas onduladas e esguias é por muitos, ainda hoje, considerada sagrada.
A Ouroborus, uma serpente ou uma cobra a morder a própria cauda, é um símbolo que invoca a roda da vida, a continuidade, o eterno retorno, o eterno voltar ao inicio, mas não o mesmo início e sim um reinício, como algo que nunca acaba e sempre se renova. A vida que se renova, que nunca tem fim, invocando as estações do ano, o movimento da Terra, o círculo onde se cria e recria a vida, a infinitude do universo.
A Kundalini, a força primal, energia de vida feminina enrolada na base da coluna vertebral é também ela uma cobra. Despertar essa cobra interna é despertar do fundo de nós mesmos, do nosso inconsciente, do nosso corpo, do chakra terra, da energia que nos deu a vida. A escola de Kundalini Tantra, na Índia, vai mais longe ao atribuir a cobra ao nosso cérebro, por se encontrar enrolada sobre si mesma (assim aparenta o nosso cérebro, como uma cobra enrugada). Despertar essa cobra será acender zonas do nosso cérebro, que não estão a ser utilizadas. É trazer à luz da consciência aquilo que está inconsciente, aquilo que está no escuro, aquilo que não sabemos, a Kundalini, a cobra é também o símbolo da expansão da nossa consciência.
Apenas mais recentemente, na história da expulsão do paraíso, a cobra foi retratada de uma forma negativa, o que lhe valeu má reputação entre nós ocidentais. A influência que a história da “origem do pecado” tem no nosso inconsciente coletivo tem força, mas peço-vos que olhem para esse nosso bichinho para além da história, para além da imagem que ficou plasmada no nosso inconsciente.
A cobra muda a pele para poder crescer. Começa o processo expondo o seu corpo ao sol (elemento fogo = transmutador) e roçando com a cabeça contra o chão, tentando romper com formas de ver o mundo. Que nem o herói que sai da sua zona de conforto e tenta romper com a estagnação, transcendendo os limites. Ligar com o Arquétipo da cobra é assumir a necessidade de libertar a roupa velha, que está gasta, para que possa haver novo crescimento, novas manifestações. É assumir que aquela pele se tornou desconfortável, apertada, limitadora. Alinhar com o arquétipo da cobra é assumir que queremos poder crescer e para isso precisamos de roupa nova, de nova pele.
Outro aspeto que a cobra nos traz é a possibilidade de ver tudo o que nos acontece na vida como uma oportunidade de crescimento. Tudo o que acontece na vida, mesmo que aparente ser mau, mesmo que pareça veneno de cobra, é uma oportunidade para transformá-lo num antídoto, que tudo cura. É pegar na energia transmutadora do fogo e fazer alquimia, recriando a nossa existência.
A Cobra é uma parte de nós mesmos e é também parte da nossa natureza. Em nós existe uma força que nos impele a transmutarmos/transformarmos as nossas vidas, que nos chama para crescer, expandir os horizontes e acender dentro de nós uma luz que transcenda crenças e padrões, que não nos servem mais.
Ana Carvalho
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