Como estamos vivendo um momento de muita intolerância, este
livro reflete sobre as várias formas de pensar e o respeito que se devemos ter as
mesmas.
“ Pensamentos são rios viajantes.
O tempo todo se enrolando, saindo e entrando, às vezes arrumadinhos, outras
vezes sem pé nem cabeça. Como fios de um grande novelo. Tem gente que pensa
poeticamente, outros só pensam de um jeito guerreiro, violento.
Pensamentos são como pássaros de
todos os jeitos e cores. Saindo de uma caixa eternamente aberta. Tem
pensamentos que mudam o mundo para melhor, outros estragam ainda mais este
mundo.”
E assim começa o livro...
É uma história simples. As
personagens moram todas numa vila e são vizinhas. Algumas vivem isoladas até
que um dia resolvem abrir as portas de sua casa e do seu coração.
A primeira retratada é uma
velhinha que tem pensamentos como fios de teia, velhos e delicados. Pensa no
seu único filho que mora longe e que vem visita-la semana que vem, e o
pensamento é tão bom que invade tudo, senta nas poltronas, acaricia o gato, faz
balançar as cortinas.
Ao lado dessa casa mora uma
pianista. Passa as tardes tocando escalas.. Ela pensa em casamento, colar de
pérolas, uma viagem, um hotel na montanha, e toca escalas e suspira e constrói
castelos de notas e desejos.
Do lado da casa da pianista mora
um rapaz que é fotógrafo. Seu dia é bater fotografias e revelar. A casa é cheia
de gaiolas. Tem três curiós, dois sabiás e quatro periquitos. Ele acha que os
passarinhos são felizes só porque é dono deles.
Do lado da casa do fotógrafo mora
uma família grande. São italianos. Moram todos juntos. São falantes, alegres,
barulhentos. A mãe, o pai, a avó, os filhos, uma tia já bem velhinha. Quando
chega à noite, a tia faz tricô, depois que as crianças já estão dormindo
quietas. Aí sim, ela pensa em paz, como se estivesse na sua aldeia, pensa nas
amigas que deixou lá longe, no poço que tinha atrás da casa, nas noites escuras
com milhares de estrelas, tudo muito mais bonito do que nesta nova cidade.
Do lado da casa da família
italiana mora um casal sem filhos. Ele é professor de alemão. Os dois são
sérios, ela fica em casa o dia todo com uma cara meio triste. (...) Ela fica
pensando, quando tiver um filhinho tudo vai ser diferente, vai ser melhor, o
filhinho vai rir, vai dizer mamãe. No outro dia, enquanto pensava no filho que
vai ter, ela pegou papeis e lápis e começou a desenhar. Aí o tempo começou a
passar de um jeito gostoso.
Do lado da casa do professor mora
uma ceramista. Passa os dias fazendo coisas lindas. (...) Ela também quer fazer
uma moringa para dar de presente para a velhinha da primeira casa da vila,
coitadinha, tão sozinha, o filho vem tão pouco, ela há de gostar de uma
moringa. Depois pensa que se conseguir pagar as contas todas e sobrar algum
dinheiro vai comprar um livro maravilhoso.
Percebe-se a partir daí que os
moradores já estão tentando se aproximar, pelo menos em
pensamento...Estreitando os laços.
Do lado da casa da ceramista mora
um homem com dois cachorros. Ele trabalha num escritório ninguém sabe de quê. Anda
sempre de mal com a vida. Quando ele passa, causa sempre um mal-estar. E seus
pensamentos vão ficando cada vez mais horríveis. Todos torcem para ele se mudar
com seus cachorros.
Certa vez, a pianista ia saindo
de casa com um monte de partituras debaixo do braço. No mesmo instante o
fotógrafo ia saindo da sua casa com um monte de fotografias debaixo do braço.
Os dois se esbarraram. Desde então eles estão namorando. Seus pensamentos são
apaixonados, coloridos como bolhas de sabão.
Os meninos italianos entraram
escondido na casa do fotógrafo. (...) Iam esconder algumas fotografias, mas
quando viram os passarinhos presos, mudaram de ideia. Soltaram todos e riram
muito ao pensar na cara que ia fazer o fotógrafo ao ver as gaiolas vazias. Mas
o fotógrafo não fez cara nenhuma, porque já estava com cara de bobo, com cara
de apaixonado.
Certa vez, a tia italiana dos
meninos levados descansava cinco minutos na calçada em frente de casa quando
viu a velhinha da primeira casa. Ficaram muito amigas.
Certa vez, a mulher do professor
de alemão tomou coragem e foi ver a ceramista trabalhar. (...) Quem sabe faziam
alguma coisa juntas? Aí foram colando um pensamento no outro e sonhavam.
Certa vez, um caminhão encostou
na entrada da vila. O homem e seus cachorros estavam de mudança. Levava com ele
muito mau humor e nenhuma saudade. Este nunca tinha saudades de ninguém. E
ninguém tinha saudades dele.
E assim é a nossa vida: cheia de
encontros e desencontros. Afetos e desafetos. Pensamentos que nos guia e alimenta nossa alma.
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