Faleceu, na madrugada desta terça (25), aos 105 anos, Elzita Santa Cruz, mãe do desaparecido político Fernando Augusto Santa Cruz e do vereador de Olinda, Marcelo Santa Cruz. Nascida em Água Preta, interior de Pernambuco, era símbolo de luta pelo movimento democrático no país. Foi incansável na busca por notícias do filho, que desapareceu no Carnaval de 1974, aos 26 anos de idade, no Rio de Janeiro, a caminho de um encontro com ativistas da Ação Popular Marxista- Leninista. Outros dois de seus dez filhos, Marcelo e Rosalina, também foram perseguidos pela ditadura. O velório de dona Elzita será realizado na Câmara Municipal de Olinda, a partir das 15 horas.O corpo será cremado nesta quarta (26), em cerimônia provavelmente restrita à família.
Dona Zita, como era chamada, iniciou sua saga por prisões, quartéis e órgãos de repressão à procura dos filhos. Sempre foi grande defensora delea. Fernando foi o primeiro a ser preso. Três anos depois, foi a vez de Marcelo que chegou a ser expulso da Faculdade de Direito da Universidade Federal de Pernambuco por sua atuação política. O atual vereador chegou a exilar-se em Portugal e passou pela Bélgica como alternativa ao cerco à família. Dois anos depois, a filha mais velha, Rosalina, atuais 70 anos, foi sequestrada por agentes da repressão no Rio de Janeiro em companhia do marido. Rosalina pertencia à organização Vanguarda Armada Revolucionária Palmares.
A busca de dona Elzita pelo filho consistiu na peregrinação por quartéis, como o DOI-Codi, e procura por entidades, políticos e autoridades do regime, além da Cruz Vermelha, Anistia Internacional e Organização dos Estados Americanos. Acabou tornando-se símbolo da resistência. Lutou até quando pôde pela descoberta do paradeiro de Fernando, embora não tivesse mais pretensões de descobrir a identidade dos possíveis assasinos do filho. Elzita perdeu a lucidez há apenas três anos, aos 102. Votou até o ano anteior, aos 101. Vivia em Olinda, ao lado da filha Eleonora e, ao redor dela, ainda orbitava toda a grande família.
Um dos netos de Elzita, Filipe Santa Cruz, filho de Fernando é, atualmente presidente da OAB nacional.
Em comunicado, o filho Marcelo Santa Cruz informou o falecimento da genitora. "Comunicamos que acaba de falecer (dia 25/06) minha querida mãe (ELZITA SANTA CRUZ,), que deixou um exemplo de vida aos 105 anos. Dizia Dom Hélder Câmara, para ter uma vida longa era preciso ter uma boa causa para lutar", afimou.
Chico de Assis, também preso político, descreveu o falecimento como uma incomensurável perda para a luta democrática. "Não apenas no Brasil! Ela era um símbolo internacional de luta pelos direitos humanos, que adquire importância ainda maior quando se percebe os ventos que sopram hoje no mundo!", destacou.
A jornalista Sílvia Bessa, do Diario de Pernambuco, acaba de por um ponto final numa minibiografia que escreve sobre Elzita a convite do Instituto Wladimir Herzog. O instituto convidou 13 jornalistas de todo o país para escrever sobre mulheres com histórias de protagonismo para o livro "Heroínas desta história", a ser publicado ainda este ano. "Foi uma grande honra para mim escrever sobre esta forte e incrível mulher, exemplo de coragem". Silvia entrevistou dona Elzita por quatro vezes para trabalhos anteriores e, para este perfil, ampliou pesquisas junto a família.
Biografia - Elzita nasceu em Água Preta, interior de Pernambuco, passou a infância em Alagoas e a adolescência em Palmares. Aos 21 anos, casou-se pela primeira vez. Seis meses depois o marido morreu de tuberculose. Cinco anos mais tarde, uniu-se ao médico sanitarista Lincoln Santa Cruz e mudou-se para Olinda. Teve dez filhos (perdeu três), além de 28 netos e 24 bisnetos.
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