Neste capítulo Gibran irá dar continuidade à ideia do
amor. Ele complementará os reflexos do amor e da inteligência no nosso mundo
concreto. O autor se inspira na filosofia Oriental como na Ocidental para falar
sobre os temas abordados, e em relação à razão e paixão, para ele são duas
ferramentas altamente úteis se soubermos usar.
Se soubermos usar a razão,
desenvolveremos inteligência; se você souber desenvolver a paixão, desenvolverá
AMOR. E esses dois sentimentos serão sintetizados num impulso de realização que
é a VONTADE (capacidade do homem de mudar a si próprio e mudar o mundo. Vontade
de determinação, transformação interna e externa.
Agora se você usa esses dois
sentimentos para baixo, terá a SOMBRA da vontade, que é o impulso cego (sem
inteligência e sem amor).
Se o homem não sabe lidar com
a razão e a paixão, fica nesse desequilíbrio usando mais uma do que a outra;
ele nunca chega a conquistar amor e inteligência.
Na Idade Média o homem foi
totalmente passional; chega na Idade moderna, totalmente racional. O homem
ainda não encontrou um meio termo, aonde ele equilibre todas as coisas que tem
dentro dele e as use como ferramentas: todas com o mesmo valor.
Sempre identificamos como uma
parte de nós, às vezes como um trauma, preconceito, e não como centro de
sabedoria ( que administra e usa tudo isto).
Gibran vai tratar deste
aspecto: o desequilíbrio do homem que descrimina uma parte de si mesmo e
portanto deixa de crescer, de atingir o seu ápice de possibilidades, que faz
dele um verdadeiro SER HUMANO.
E a sacerdotisa se adiantou novamente e
disse:
-Fala-nos
da Razão e da Paixão!
E ele respondeu
dizendo:
Foi a sacerdotisa quem
perguntou sobre o AMOR e agora pergunta sobre a RAZÃO e a PAIXÃO. Sendo ela uma
sacerdotisa, tem a preocupação com a sacralização da VIDA, ou seja, ela faz com
que todos os elementos que existem dentro do homem faça sentido, possa ser
utilizado para fazê-lo crescer e ajudar a humanidade.
Existe um antropólogo do
século passado que diz: “ O sagrado é a função de dar sentido”. Uma flor quando
desabrocha na primavera é sagrada; o sol quando nasce pelas manhãs é sagrado
porque faz exatamente o que corresponde
a ele. O homem quando desperta para virtudes, valores e sabedoria é sagrado
porque está fazendo exatamente o que se espera dele como homem.
Se as flores deixarem de desabrochar
nas primaveras, perderíamos muito. Se o sol deixasse de nascer, morreríamos
todos. Se o homem deixa de realizar-se de valores, virtudes e sabedoria irá se
desumanizar. É ingênuo achar o que falta para a humanidade são coisas
materiais.
O que falta para humanidade
são homens.
A fome existente no mundo é
falta de comida ou de fraternidade? É falta de bens materiais ou de
honestidade?
Então Almitra, como
sacerdotisa, a função dela naquele povoado era a sacralização da vida. Fazer
com que o homem aprendesse a lidar consigo mesmo.
Ela esbarra com uma grande
dificuldade que esbarramos todos nós: o domínio da razão e paixão / saber
usá-la. Temos de ter uma identidade acima das duas. Se eu acho que sou a razão;
eu nego a paixão. Se eu acho que sou a paixão; eu nego a razão. Se eu acho que
sou um ser que tem uma essência imortal, que presencio essas coisas como uma
caixa de ferramentas aberta na minha frente
O homem não sabe controlar a
si próprio se ele se identifica com fenômenos passageiros. Ele acha que ele é
os seus defeitos, suas paixões.
Nós viemos aqui para saber
lidar conosco mesmo, mas isto só é possível quando houver uma
desindentificação.
Exemplo: Quando você quer
educar uma criança ou um animal, se você se identifica com ele, você não
consegue.
Numa relação de pai e filho às
vezes vivemos um equívoco de que o pai é amiguinho do filho, quando o filho
psicologicamente precisa do amiguinho, mas também precisa do papel do pai. Por
que se o pai resolve ser o amiguinho, quem vai ser o pai? Vai haver um vácuo psicológico na vida desta
criança e o pai não tem autoridade. Não tem capacidade de ajudar esta criança a
amadurecer e ser formada. Por quê? Porque ele se identifica com ela, ao invés
de ser capaz de conduzi-la de fora, ocupando o seu papel. Resumo: Quando você
se identifica com algo, você não tem autoridade sobre ele.
O filósofo Sêneca disse:
“Certifica-te de ver morrer os teus defeitos, antes de ti. Assiste ao menos ao
funeral de um ou dois.”
Vossa alma é frequentemente um campo de
batalha
onde vossa razão e
vosso juízo combatem vossa paixão e vosso apetite...
Fica uma guerra. Como todos os dois são você mesmo, seja
quais dos dois que vier, você perdeu.
É uma forma de lidar com a realidade que deixou de ter.
No Egito existe um livro: Caibalion ( que são as leis de
Hermes Trimegisto no qual explica em 10
leis o Universo manifestado).
Tem um princípio que é o da neutralização que diz: “você
só consegue administrar um conflito quando a tua consciência pula para um
patamar superior.”
A partir daí tua consciência vai perceber o que é justo,
coerente, sensato ou não...pois não há mais desejos, porque entrou a justiça.
Uma das coisas bonitas entre razão e paixão que culmina
em AMOR é a raiz desta palavra que vem de uma língua proto-indo-europeu, que
vem provavelmente desta sílaba que o bebê pronuncia quando chama pela mãe: “ma...ma...ma...”
Ele compreende na mãe, não só aquela que vai dar o
alimento, o seio... mas aquela que vai protegê-lo, aquela que vai dar amor,
algo que o protege e envolve sem interesse porque só quer o bem dele, onde se
sente seguro.
O amor é a confiança de que alguém não está querendo algo
de você, alguém que quer só o teu bem e
vai alimentar no nível físico, psicológico, mental e se possível até no
espiritual porque ela irá dar tudo que ela tem de melhor sem querer nada em
troca.
Evidentemente para podermos julgar com amor uma disputa
qualquer teríamos que não ter desejos, não termos interesse. A consciência está
no patamar mais elevado. E aí podemos julgar quando é hora da razão e quando é
hora da paixão e não negar nenhum dos dois. Qualquer potencial humano negado,
perdemos nós como seres humanos.
Pudesse
eu ser o pacificador de vossa alma,
transformando a discórdia e a rivalidade
entre vossos elementos em
união e harmonia.
Al Mustafá se coloca: “quem pudera eu harmonizar isto em
vocês”. Sabe por quê? Se eu não harmonizar ou vocês mesmos se harmonizarem e ficarem com este desequilíbrio: passionais
demais ou racionais demais você será explorado e manipulado. É uma das coisas
mais verdadeiras da história.
Como nasceu o uso dapalavra exploração. É difícil saber
como surgiu ...mas sabemos que na Grécia, um grupo de cidadãos (os sofistas)
manipulavam as pessoas na Grécia Antiga e usavam duas coisas para manejar e
manipular com maior facilidade. Existe uma dualidade no ser humano que é muito
conhecida ao longo da história: Quando a paixão se eleva, a razão baixa e
vice-versa. O homem não consegue equilibrá-la no mesmo patamar.
Então a pessoa que está muito
racional, em geral não está sentindo nada; ou quando ela está muito passional,
no geral não está pensando.
Sabe como se faz isto num discurso quando alguém quer
manipulá-lo?
Num discurso você vai
fundamentando bem o teu argumento racionalmente, cita várias autoridades no
assunto, conquista a confiança do público... Quando você conquistou a
confiança, ou seja, nos 10 a 15 minutos iniciais, você depois, joga um
argumento muito emocional gerando um clímax. Na emoção as pessoas não pensam,
você dá uma pequena desviada da lógica: 2 a 3 graus...desvia e desce...continua
fundamentando racionalmente : cita Platão, exemplos que todos concordam;
conquista um pouco mais de confiança, gerando um outro clímax emocional,
ninguém pensa...mais uns 3 ou 4% de desvio. Logo, você é capaz de conduzir as
pessoas para 90% de desvio ou mais. Todo bom manipulador, tem um bom assessor que conhece lógica.
Máxima Universal: Cuida dos
teus defeitos para não seres explorados por ele. O desequilíbrio entre razão e
paixão abre uma fresta porque quando ficamos passionais não temos controle
sobre isto e não raciocinamos. Quando estamos muito racionais, movidos pelo
interesse, não sentimos nada e essas coisas são uma fresta de desequilíbrio.
Mas como
poderei fazê-lo,
a menos que vós
mesmos sejais também pacificadores,
e mais ainda,
enamorados de todos os vossos elementos?
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