Existem ou não existem leis
atemporais, universais? Se os homens não existissem, as leis existiriam?
Existem leis no Universo independente da nossa compreensão sobre elas?
É lógico que a Ciência nos
mostra um monte de leis, mas quando se refere ao campo moral, ao campo do
comportamento humano... Existem leis que regem o comportamento humano, assim
como regem o comportamento da matéria? Como a lei da gravidade, lei da atração,
enfim, todas as leis da física que nós tratamos e sabemos que são inexoráveis e
que existiria independente da existência do homem?
Imagine que fôssemos
educadores e que fosse reformado nosso sistema de ensino no Brasil hoje, então
segundo grau não seria mais três anos e sim, cinco e irão ter outras
disciplinas...
Nós criamos um módulo que é
só ideia; ainda nenhum ser humano percorreu aquilo, mas um ser humano que quer
atingir um estágio intermediário, ou seja, o estágio secundário de ensino vai
ter de passar por ali; mas antes que o primeiro ser humano transmite por ali,
aquilo existiu como algo ideal. Imagine que a condição humana possa ter possa
ter pré-esistido ao primeiro ser humano como algo ideal, como modelo? Que parte
de um principio e vai até o fim; que tem estágios que precisam ser cumpridos e
leis que regem a transição por esses estágios?
E que, ainda que não
houvesse um ser humano, essas leis como ideias já existiriam? As leis que regem
a evolução moral do homem? Isto era o que esses autores acreditavam. Platão
acreditava totalmente nisto. Ele acreditava que não existe nada no Universo que
não seja regido por leis, então, por que nós não seríamos? Não é curioso que
nós nos sintamos uma exceção? Nada no Universo é desprovido de leis.
Gibran considera que as leis
existem e regem a condição humana também, assim como rege a gravitação dos
astros, acreditem os homens ou não.
Então um advogado disse:
“Que pensas de nossas leis,
Mestre?”
E ele respondeu:
Vós vos
deletais em estabelecer leis,
mas vos deletais ainda mais em violá-las...
Platão, na república vai
falar o seguinte: O mito de Giges que diz que havia um homem muito virtuoso da
região da Lídia, só que um dia ele acha um anel e quando coloca no dedo se
torna invisível, logo ele começa a violar todas as leis da sociedade porque
ninguém o via. Giges era ético ou não era ético?
Ele obedecia as leis ou não? Era virtuoso ou não?
Percebam que esta é uma ética de
aparências, de coersão e não de convicção.
Imaginem vocês que Giges achasse
esse anel e continuasse virtuoso, invisível... e as pessoas soubessem disso:
Que Giges tinha um anel e quando ele ficava tão virtuoso quanto ele era quando
visível. O que as pessoas falariam? Entre elas, elas elogiariam por medo que
Giges viesse explorá-las. Mas, internamente elas pensariam: “Que estúpido! Como
perde uma oportunidade dessa? Se eu achasse esse anel, comigo seria
diferente...
As pessoas respeitam as
leis por medo de sofrer com o descumprimento delas, mas internamente, não as
amam. Respeitam por medo, mas internamente, se pudessem descumprir impunemente,
não cumpririam. Isto é o que Gibran diz: “Vós vos deleitais em estabelecer
leis, mas vos deleitais ainda mais em violá-las.”
Por que a lei é filha do
medo, da coersão pelo medo de sofrer pela infração da lei, não pela convicção.
Se você fosse Robson Crusoé
e vivesse sozinho numa ilha, que leis você cumpriria?
Você é aquilo que você faz
quando a última porta se fecha atrás de você.
Como crianças que brincam à beira do oceano,
Edificando, pacientemente, torres de areia e, logo em seguida, destruindo-as
entre risadas.
Ele aqui fala de duas
categorias de seres humanos. Imagine um
ser humano que sabe que as suas leis são provisórias, temporais; ele está
fazendo o melhor que ele pode e sabe que com um tempo haverá novas situações em que àquelas leis não irão cobrir; logo ele as
estabelece porque são as melhores que têm condições de ver naquele momento.
Mas, está preparado para reconstruir quando a água vier e destruir o meu
castelo de areia. A pureza das crianças quando diz: “eu faço uma lei para cobrir essas duas
situações: mas eu sei que as situações não serão sempre duas. Virão três,
quatro, cinco e essa lei será destruída e eu estabelecerei novamente.
Já que não vejo uma lei
Universal que eu não possa adaptar a esta situação, então estabeleço uma lei em
cima do que eu estou vendo. Eu sei que ela é provisória. Eu não confundo a
minha pequena lei com uma grande lei do Universo que eu mata e morra por ela.
Mas enquanto edificais vossas
torres de areia,
O oceano atira mais areia à
praia,
E quando as destruís, o oceano ri
convosco.
Na verdade, o oceano sempre ri com
os inocentes...
É como se
fosse a diferença entre o dolo e a culpa. Eu sou culpado dessas leis serem tão
provisórias? Sou pela minha ignorância, não pude fazer melhor. Mas não tenho
intenção de aprisionar ninguém com essas leis. Estava tentando cobrir a
realidade com o tamanho do meu cobertor e agora vou ampliá-lo e agora não me
sinto dono da verdade, era o melhor que eu tinha, já que não capto leis
Universais e Platão fala do verdadeiro legislador como pontífice, que tem uma
estatura moral, espiritual, psicológica para captaras leis universais e
adaptá-las ao mundo. Se eu não tenho esse grande legislador, só tenho eu, deixa
eu ver o melhor que cobre a realidade que estou vendo. Eu sei que o Oceano irá
trazer mais areia e eu vou ampliar essa lei para cobrir essa nova necessidade.
Eu não sou dono da verdade... E quando o Oceano destrói o meu castelo,
engraçado como não vi isto! Olha mais areia! Meu castelo tem de incluir essa
areia. O Oceano rir com os inocentes...está bom; vamos construir juntos.
Agora vem outra situação: quem
tem só um pouco de areia, que é só aquilo que ele vê. Constrói uma lei com
aquilo e acha que é uma lei inexorável, Universal e ele mata e morre em nome
dela. Acha que sua pequena lei , é a lei e gera uma rigidez.
Veremos que o dogmatismo e muitas das injustiças
cometidas na história, nasceram dali. Quando o homem diz: “ eu tenho a verdade”.
Sabe o que é que Sócrates dizia?
·
Ou ele tem mesmo e é um sábio.
·
Ou ele não sabe nem o que é a verdade; é um
ignorante absoluto.
Em nenhum
dos dois casos serve para filósofo.
O filósofo é um cidadão que
tem um montinho só de areia e sabe que tem
um montinho só; ele está esperando por mais areia para construir o
segundo. Ele não se sente em nenhum momento dono da verdade. Ele tem essa
pureza de rir junto com o oceano quando derruba o seu castelo de areia e está
sempre em busca de aperfeiçoamento. Sábios completo é muito raro; ignorantes
completos é menos raros.
Buscadores da verdade, que não se sentem donos da
verdade nem donos das leis Universais, esses infelizmente têm poucos. Muitos se
sentem donos da verdade com um pouquinho de areia que eles têm; ou seja, a
ignorância quando é consciente, ela é inofensiva; o pior é a ignorância quando
se arroga dona da verdade. O próprio Platão dizia que o maior impedimento para
se ter algum conhecimento é se achar que você já tem.
Quando Sócrates dizia: “Só é útil o conhecimento que nos
torna melhores”. Eu só sei que nada sei. Ele sabe que o conhecimento que ele
tem é tão ínfimo em relação ao Universo para ser explorado e conhecido.
Se o teu
Universo é pequeno, você vai achar que o teu pouco é muita coisa...Um Universo
fechado, restrito faz com que os homens se sintam donos da verdade.
Que dizer
porém, àqueles para quem a vida não é um oceano, nem as leis baixadas pelos
homens são torres de areia?
Existem aqueles
que acham que a vida é uma poça d’água e que sua lei cobre toda essa poça e
portanto há de obedecer inexoravelmente.
Platão no
livro “ O Político” diz o seguinte: Imagine que você tem um médico faz uma
prescrição para você e essa prescrição como ele vai viajar por 10 dias, ele
diz: “ tome este medicamento , nesta dosagem por 10 dias” mas imagine que este
médico volte em 5 dias e olhe para você e diz: “Você está muito melhor, não
precisa tomar todo este medicamento; toma só a metade”. Ele tem autoridade para
fazer isto? Tem, porque ele criou a prescrição, ele é capaz de analisar
novamente a realidade e reavaliá-la.
Imagine
você chegar pra ele e dizer:
“Não,
existe uma lei escrita que diz que eu tenho de tomar este medicamento, como é
que o Sr. Está querendo descumprir a lei?”
“Como
assim, se fui eu que criei esta lei, estou vendo.”
Quem não vê
nada, pega uma prescrição e considera como verdade Universal. Ele vai querer
que até uma pessoa sã, tome aquela dose de medicamento e vai empurrar de
garganta abaixo se ela não quiser tomar. Ela não tem nenhuma noção da realidade
que gerou a prescrição. Isto faz com que você fique escravo daquilo.
Então,
aqueles que não consideram que o Universo é um Oceano. Imagine um pouco de
mentalidade simbólica, filosófica, quando você olha o Oceano, sobretudo à
noite. O Oceano é muito misterioso, dá uma ideia de onipotência, imensidão...o
simbolismo do Universo, dá uma sensação de poder, de coisa infinita. Você olha
o Oceano tomado por algo misterioso que guarda o Universo dentro dele, ou seja,
o homem que imagina que o Universo não é um Oceano, é uma poça d’água e que a lei
cobre todas as necessidades desta poça, o que este homem irá fazer?
Quantas vezes
na história já tivemos homens, assim?
Que criaram
leis e disseram: Isto aqui, explica o Universo.
Aqueles cuja vida é uma pedra, e a lei um
cinzel
com o qual procuram esculpi-la à sua
própria imagem?
Que dizer do imobilizado que odeia os bailarinos?
No livro: “
A guerra da arte” o autor diz que existe um acordo tácito em prol da
mediocridade. Quando uma pessoa reage é tomada pelos demais como traidor.
Quando você reage você mostra que todo mundo poderia ter reagido. Você expõe a
inércia de todo grupo. O pior pecado do caranguejo é pular na beira do balde.
Aqueles que ficam lá dentro, o odeiam. Ele mostra que é possível um caranguejo
pular na beira do balde. Os homens são imobilizados. E se alguém baila? Isto é
um pecador imperdoável. Está descumprindo uma lei terrível!
Um herói
destrói a teoria da mediocridade. No momento histórico de decadência, a maior
subversão que existe é ser virtuoso.
E do boi que gosta do seu jugo
e considera o gamo e o cervo
seres extraviados e vagabundos?
E da serpente idosa que não pode mais
largar sua pele
e qualifica todas as outras de desnudas e
impudicas?
É como se
fosse a fábula da “Raposa e das uvas”. Eu amaria, mas eu não ouso. E se ninguém
ousar? Eu não tenho a perspectiva do que deveria ser. Então, aquele que ousa,
me fere.
Uma passagem do livro de Shakespeare
“Otelo” tem um personagem muito virtuoso, Cássio, e um outro muito vicioso que
era Iago. Então numa das falas de Iago ele diz: “Todos os dias ele me fere com
sua beleza”. A sua beleza me mostra todos os dias quão feio eu sou.
E daquele que
chega cedo ao banquete de núpcias e, depois,
saciado e esgotado,
segue seu caminho, dizendo que todo festim
é uma violação da
lei e todo festejador é um culpado?
Ou seja, você é a 1ª a chegar na festa, come bastante
e quando os 1ºs convidados chegam, você se retira dizendo: Eu sou virtuoso e
não participo desses festins da gula e
do pecado; ou seja, é o 1º a avançar e quando se sacia, culpa àqueles que
caíram no mesmo erro.
Platão diz que: “ cada vez que vemos um vício fora,
estamos vendo uma possibilidade que existe dentro de você.” Jung também fala
sobre isto: a teoria da projeção.
Esta possibilidade que existe dentro de você, se você
odeia fora é porque ainda não dominou.
Se você tem compaixão é porque você já viu e já
dominou.
Existe duas possibilidades: aquilo que você domina; àquilo que você não vê, vai te
dominar porque nós somos um microcosmo.
Tudo que existe fora , existe dentro em miniatura.
Se eu vejo uma pessoa
terrivelmente preguiçosa e eu não dominei minha preguiça, o que sentirei
por ela é: ÓDIO, pois ela mostra algo que eu queria varrer para dentro do tapete.
Ela me obriga a ver.
E se eu já
lutei contra a preguiça e já dominei? Coitado!! Ele não sabe quanto vai sofrer;
eu sei, posso ajuda-lo. Não irá provocar ódio ou rejeição.
Que direis destes todos; senão que eles
também se mantêm
na
claridade do sol, mas de costas para o Sol?
Veem suas sombras, e suas sombras são suas
leis.