Como se diz: “ A consciência nasce do contraste “. Quando as pessoas percebem que Al Mustafá estava indo embora, começam a reconhecer o seu real valor, logo; a população daquele vilarejo o cerca e começam a fazer perguntas sobre as coisas práticas e fundamentais da vida, como: AMOR
ILHO, CASAMENTO, JUSTIÇA, etc..
Trata-se de um MITO, ou seja, tudo isto está acontecendo dentro de nós. O mito tem esta estrutura: o personagem central é o homem e os secundários são elementos internos dele mesmo, projetados do lado de fora.
Então ele está dialogando consigo mesmo, com seus medos, suas limitações, sonhos...
A estrutura dos nossos SONHOS é muito parecida com a
estrutura do MITO. Nos sonhos projetamos fora, elementos internos também, no
geral , não tem mais do que nós mesmos
em nossos sonhos.
Iremos falar sobre A BELEZA, um assunto bastante
polêmico nos nossos dias. Para Platão este é um dos assuntos fundamentais, pois
ele sempre se preocupou com o BEM, o BELO e o JUSTO.
Uma das coisas que Gibran chama atenção neste capítulo é que o BELO é diferente do AGRADÁVEL.
Existe dentro do homem dois núcleos de consciência: a
sua ESSÊNCIA e a sua APARÊNCIA (aquilo
que ele é em profundidade e aquilo que ele é na superficialidade – o mundo
espiritual / o mundo material. Cada um desses mundos percebem a realidade de
forma diferente.
Um tem um senso estético ( percebe a beleza no plano
espiritual; o outro tem o sensorial, percebe a beleza através do que o atrai,
do que é agradável, do que provoca prazer.
Muitas vezes confundimos os dois, ou achamos que só
existe o agradável.
Muitas vezes chegamos para alguém e dizemos:
- Isto é belo!
Respondem:
- Ah!!! Isto é muito relativo, o que é BELO para você
pode não ser para mim!
Quando você vai perceber nesses autores clássicos que
a BELEZA é um dos elementos mais importantes da formação do ser humano, iremos
perceber que não é tão relativo assim...
Se você oferecer VENENO para alguém essa pessoa não
irá dizer: “Isso é relativo, o que mata você não mata a mim!” Isto não é
verdade! Mata todo mundo!
Existem certas coisas que são universais: o que
rebaixa ou o que eleva. O que deforma o caráter, é mau para toda humanidade;
aquilo que forma, é bom para todos mundo. Existem elementos gerais para
humanidade. Não somos tão relativistas assim.
E um poeta disse:
“-
Fala-nos da BELEZA”
E
ele respondeu:
Existe sempre uma relação entre: quem pergunta e a
pergunta em si. Sobre a BELEZA, a pergunta é feita por um poeta. É muito
interessante, porque segundo Aristóteles, POESIA vem de POESIS (construção).
Parece que existem certas realidades que estão num plano mais sutil e a poesia
é a linguagem ideal para expressá-las. A poesia não define, sugere. Supunha que
você pergunte no sonho: o que é a morte? E você sonha com uma pessoa bailando.
Os povos antigos quando iam escrever livros sagrados, não usavam prosa, usavam poesia, pois ela não descreve,
ela sugere e deixa você refletir.
É muito lógico que seja um POETA que pergunte o que é
BELEZA. A poesia é a linguagem adequada para você construir no mundo concreto,
impressões que vem do mundo espiritual, mais sutil.
Dificilmente quando você pega uma bela poesia, você
consegue descrever tudo o que o autor está querendo dizer ali. A verdadeira
poesia tem muito de MITO, porque hoje, tudo temos de definir.
Você chega num Supermercado, o rótulo não corresponde
ao conteúdo. E isto acontece nos sentimentos, nos objetos, nas palavras...
logo, nem todos que se diz POETA é POETA.
Onde procurareis a beleza
e
como a podereis encontrar,
a
menos que ela mesma
seja
vosso caminho
e
vosso guia?
É bem
interessante isto! Porque Platão vai
definir a BELEZA como aquilo que eleva. Para Platão a BELEZA é a única coisa
que pode tirar você de um círculo vicioso, de elementos repetitivos que você
não encontra saída. Imagine se você tem como objetivo de vida desenvolver a
fraternidade, a compaixão, a compreensão de si mesmo e dos demais. Isto é um
objetivo de vida bastante louvável. Isto é um princípio que você impôs a sua
vida. A verdade não é aquilo que corresponde aos fatos, mas que corresponde ao
BEM.
Suponhamos que você conhece alguém que aprontou
bastante com você, mas você fez a opção de sair deste círculo vicioso de raiva,
chateações...Você optou pela fraternidade, pela compaixão em relação às
fraquezas humanas.
A verdade neste caso, não é o que corresponde aos
fatos, e sim, o que corresponde ao BEM.
Tem horas na vida que a única saída que você tem é
para cima, se você tentar sair para qualquer lado, não sai; porque gera um ciclo
de elementos que corresponde a FATOS, mas nem por isto são reais.
Quando algo é realmente BELO, não gera um elemento de
atração, de querer possuir; e sim de nostalgia. Saudade de alguma coisa. É como
se você conhecesse um determinado mundo onde as coisas eram todas belas assim.
É como se você já tivesse estado lá algum dia. E aquilo te relembra, te provoca
uma sensação de nostalgia, saudade de um lugar que consciente você esteve, mas
que algo dentro de você diz que você já esteve, sim; e que você pertence a este mundo, onde todas as
coisas são assim: nobres, elevadas, harmoniosas.
Platão diz: “A verdadeira beleza não provoca desejo
de posse, e sim um convite para renunciá-la”. Passar através dela e voltar pra
sua casa interna.
Se eu vejo uma pessoa com uma atitude honrada e
justa, isto não é belo? Logo, te dar uma dor no teu coração como se alguma
coisa te dissesse: “Existe um mundo onde tudo é assim e você é de lá. ” Como se
fosse uma puxada para cima; uma puxada de
volta para casa.
Daí a conclusão dele de que o BELO é sempre aquilo
que eleva.
Você ver através da BELEZA uma oportunidade de
tornar-se melhor. Ela te inspira, te eleva. Você não tem vontade de possuir as
coisas belas, e sim tem vontade de tornar-se melhor para se parecer com elas. É
uma chamada da consciência para cima.
E como podereis falar,
a menos que ela mesma
teça vossas palavras?
Você vai ter de buscar dentro de você o que é BELO,
nobre, aquilo que tem mais afinidade com o bem, o que tem mais compaixão pelos
seres humanos, aquilo que o teu coração vibra mais fundo e olha para as coisas
a partir daí, então você vai identificar a BELEZA. Semelhante reconhece
semelhante. Se você não subir tua consciência naquilo que você tem de mais
nobre, de mais belo, você não vai ser capaz de ver o que é BELO.
O diretor do filme Mahabharata que
conta a história de um épico hinhu, se mudou para Índia e ficou lá anos
para fazer este filme. Na época, saiu entrevistando todos mundoque conhecia a
história de luta entre os clãs. É uma história tradicional, como se fosse uma
Odisseia para eles. Então quando ele perguntava quem conhecia melhor a
história, diziam para ele: “Procure fulana que é a que mais entende desta história, ela é muito bela.” Então ele ficou pensando...Todos
haviam dito que ela era BELA. Quando ele chegou lá, esta senhora tinha uns 80
anos de idade, e era realmente muito BELA. Em 15 minutos conversando com
ela, ele percebeu a beleza dela
irradiando. Então ele compreendeu que ainda hoje, apesar da decadência dos
valores que é generalizado no mundo inteiro, pois a Índia não está fora disto,
estes detalhes da linguagem eles ainda conservam: A MULHERÈ BELAQUANDO É SÁBIA.
Quando ela é jovem com um corpo
atraente, ela é atraente; eles não dizem que é BELA. Eles não usam esta
palavra, pois tem um respeito pela palavra BELEZA.
Bela para eles tem muito a ver
com o conceito platônico. BELA é algo que te eleva, te gera um estado de
nobreza. Traz à tona o que você tem de melhor.
Se você não encontrar beleza
dentro, você não a encontrará fora. Não tem um ângulo de visão que te permita
identificar, ou seja, vai sempre achar belo o que é atraente, o que é
agradável. Sai utilizando e experimentando as coisas, e logo percebe que são
desinteressantes.
Já perceberam que aquilo que o
homem atual acha belo, depois de pouco tempo que ele possui, já enjoou. Se uma
coisa fosse realmente BELA, seria BELA a vida inteira.
Nós que conhecemos a história de
Nelson Mandela. Você acha que daqui a 10, 20, 30 anos iremos deixar de achar
Nelson Mandela BELO? Não vai deixar nunca!!!Agora uma pessoa fisicamente BELA é
como uma barra de chocolate, você acha bela enquanto não enjoa o paladar.
A verdadeira BELEZA não se
esgota NUNCAAAA!!!! Ela vai ser sempre inspiradora e bela para você.
Os
aflitos e os feridos dizem:
-“A
beleza é amável e suave
como
uma jovem mãe,
meio
encabulada,
na
sua glória,
ela
caminha entre nós.”
Ele
irá começar a partir de agora com m monte de dualidades. Vamos aos exemplos:
Se
você quer motivar um cachorro a sair da cadeira sem tocar nele, só há duas
maneiras: ou você oferece uma comida, uma cadelinha- que é o prazer, desejo. Ou você ameaça bater
nele- sai por medo ou dor.
Consciência
animal só tem esses dois motivadores: ela vive na polaridade- MEDO/ DESEJO. DOR
/ PRAZER.
Quando
os humanos reduzem sua consciência a do animal, ficam iguaizinhos.
Quando
o ser humano não consegue elevar a sua consciência além dessa equação animal,
ele vai reduzir todos os valores do céu para terra e vai acabar com eles.
A
justiça para essas pessoas que vivem na polaridade, normalmente é aquilo que as
beneficia em cada contexto.
Então
para essas pessoas, elas acham que a BELEZA é o polo onde ela está, ou o
oposto, mas nunca nada lá em cima. Sempre no chão.
O
que é que uma pessoa aflita e ferida está precisando? De uma mãe.
Suave,
delicada, que apazigue a sua dor, que cuide dele.
Ou
seja, a polaridade que está oposta. Ele está aflito, solitário, angustiado. Ele
está precisando de cuidados, de carinho. Está carente.
Então
o que é a BELEZA? É aquilo que falta para ele naquele momento. Materialmente
falando do ponto de vista de suas
necessidades concretas.
Os apaixonados dizem:
Não,
a beleza é uma força
Poderosa e terrível!
Como
uma tempestade,
ela
sacode a terra abaixo de nós
e
o céu
acima
de nós.
Neste caso,
as pessoas estão na polaridade das paixões e estão sofrendo com os pensamentos
obsessivos. Pensa no outro: manhã, tarde, noite e madrugada. Sente-se
escravizado com aquilo e está saturado, então quando alguém fala em beleza,
este negócio para elas (as pessoas) é a pior coisa do mundo, porque está
sofrendo. Então, polariza ali a experiência que está vivendo. A beleza o meteu
nesta fria, em que se apaixonou e não consegue sair deste círculo vicioso.
Sempre os polos: ou o oposto ou aquilo em que ele está.
Os cansados e os gastos dizem:
“A
beleza é um múrmurio suave.
Fala
em nosso espírito.
Sua
voz cede aos nossos silêncios.
como
uma luz tênue que treme
por
medo da sombra”.
Eles não
estão extremamente cansados e gastos? O que é a beleza? Descanso, suavidade,
silêncio, tranquilidade...ou seja, a beleza é um resort à beira da praia do
Nordeste. É tudo o que eu preciso para me livrar do meu esgotamento, do meu
cansaço: suavidade, silêncio, tranquilidade.
E
se fosse uma pessoa raivosa, impetuosa, agressiva...o que ela diria da beleza?
Mas os turbulentos dizem:
Nós a ouvimos gritar entre as montanhas
e,
com seus gritos,
chegavam
o tropel de cavalos,
a
bater de asas e o rugir de leões.
Diria:
“Que besteira de tranquilidade, meu amigo! A beleza é fúria, é m tropel de
cavalos avançando descontrolado... Por quê? Porque eles não conseguem controlar
os seus cavalos; tem um vício de impetuosidade, de agressividade... E para ele
a beleza é isto. Se ele achasse que é feio, não seria assim.
Comentávamos
um detalhe cruel dos nossos defeitos. Por que temos os defeitos? Porque
gostamos deles. Se nós não gostássemos dos nossos defeitos, não já teríamos
posto eles para fora de casa?
Se
você tem em casa um objeto que você acha 100% ruim, há anos que ele está ali te
incomodando e você ainda não pôs no lixo? Alguém fica com uma coisa dessas?
Se
você achasse 100% ruim os seus defeitos, você já teria os colocado para fora de
casa. Ele permanece na tua casa psicológica porque você gosta deles. Então, o
impetuoso, agressivo, ele acha que isto é belo e denomina isto como coragem.
Então o fato dele ser rude com as pessoas, é coragem.
Eu sou muito sincero! Já viram pessoas
que falam coisas que ferem os outros e chamam isto de sinceridade? Então, o
impetuoso, gosta do ímpeto, porque senão, não o teria Nós gostamos da nossa
rudeza...às vezes gostamos da nossa preguiça. Existem pessoas que quando você
entra na casa delas, parece que passou um furacão e fala que é o seu estilo de
organização? Como assim o seu estilo?
Você é um baderneiro. Não existe este estilo. Mas nós gostamos dos
nossos defeitos e identificamos a beleza com eles.
À noite,
os
guardas da cidade dizem:
“A
beleza despontará
do
Oriente,
com
a alvorada
E
ao meio-dia, os
trabalhadores
e
transeuntes
dizem:
Nós
a temos visto
inclinada
sobre a terra
das
janelas do poente.”
Um guarda,
eu faz guarda à noite, o que é paraíso para ele? Quando amanhece que ele vai
para sua casa e descansa. Desfruta do prazer do descanso.
E
o trabalhador no calor do meio dia, o que é para ele o paraíso? A maravilha,
das maravilhas? À noite, quando ele larga lá sua enxada, sua pá e vai para
casa, pro descanso. Se você perguntasse o que é o paraíso para um esquimó, ele
diria, Brasília nesta época. Se você
perguntasse qual é a dor do Saara, ele diria: a vida do esquimó. A minha
carência, àquilo que preenche minha carência, no plano de consciência em que eu
estou.
Nós
não conhecemos valores absolutos no geral, porque não refletimos, não os
buscamos. Então nossos valores são todos relativos.
Existe
uma história bobinha e ridícula, mas se encaixa muito bem no que Gibran está
falando. Não é poética, mas ilustra muito bem esta ideia.
Um
agricultor vivia reclamando da vida, não gostava de nada e tinha uma vida boa,
sua família era sadia, sua casa estava arrumadinha...um dia, se saturou e
resolveu fazer uma prova com ele. Foi lá no campo, pegou a vaca mais gordinha
que tinha e colocou no meio da sala, porém a sala não era grande. Imaginem uma
vaca, no meio de uma sala relativamente pequena e mugindo a noite inteira.
Esbarrando em tudo e quebrando tudo. Fazendo um inferno. Aquecendo o ambiente,
aquela sujeira...depois de dois dias ele estava desesperado, não aguentando
mais aquela vaca. Então foram lá, tiraram a vaca, ele se sentiu super feliz.
Vocês percebem que em geral é um conjunto de relatividades?
O
prazer é simplesmente a ausência da dor.
A
beleza é simplesmente a ausência do feio. Não existe nada de absoluto que transcenda essas dualidades, que esteja
acima.
No inverno,
os
prisioneiros da neve dizem:
Ela
virá com a primavera,
pulando
sobre as colinas.
E
no calor do verão,
os
ceifeiros dizem:
Nós
a vimos dançar
com
as folhas do outono,
e
havia neve no seu cabelo.
Ou seja, o
que preenche minha carência? O que me falta para estar confortável neste momento dentro do plano de
consciência em que estou?
Todas essas coisas dissestes da beleza.
Na
verdade não falastes dela,
mas
de desejos insatisfeitos.
E
a beleza não é um desejo,
mas
um êxtase.
A beleza
não é o momento em que o seu copo está vazio e você quer água que o falta
preenchê-lo. A beleza é o momento em que seu copo transborda e ele se eleva
tanto que você tem a necessidade de dar. A beleza é abundância, é plenitude,
não é carência. A beleza não é aquilo que te falta para você preencher os seus
desejos. É aquilo que te sobra para você atender as necessidades da humanidade.
É aquele momento em que a tua consciência se eleva, acima dessas necessidades;
e pode doar. Você pode identificar aquilo que existe de mais nobre a tua volta,
porque encontrou a nobreza dentro de você.
A beleza é superação e não carência. É plenitude, e não vazio.
Entre os
Celtas eles tinham um mito que era “ o
salmão da sabedoria” e eles diziam que em algum lugar celeste, no paraíso dos
Celtas, havia um lago que tinha em suas margens uma amendoeira e lá dentro
vivia um salmão. Salmão para eles era um animal sagrado. Eles diziam o seguinte, que a amendoeira dava
flores e amêndoas o ano inteiro e jogava aquelas amêndoas dentro do lago e o
salmão comia aquelas amêndoas e ficava feliz.
A
felicidade do Salmão era fazer com que aquela fonte nunca parasse de jorrar,
fazia com que a amendoeira nunca parasse de dar flores e frutos. E o fato de
que ela nunca parasse de dar flores e frutos, fazia com que o salmão nunca
deixasse de se alegrar. Então havia um ciclo de plenitude que era eterno,
porque ali você tinha três seres realizados. Que jorravam a sua felicidade e
mantinham todo o sistema em equilíbrio. Percebam que uma pessoa infeliz é
carente. Ela está sempre querendo receber. Ela está sempre querendo ser o
centro das atenções.
Uma pessoa
plena, ela tem condições de pensar em mais do que em si mesmo. Ela começa a
desenvolver a generosidade e começa a querer compartilhar. Então, a beleza não
é aquilo que te falta para você ficar confortável. A beleza é o que você
atingiu de melhor na sua vida e agora tem necessidade de compartilhar.
A beleza
nasce a partir do momento em que você começa a achar a vida bela; as coisas que
acontecem, boas. Começa a aprender com as circunstâncias. Tudo começa a fazer
sentido. Você está se encaixando bem dentro da vida, então as coisas começam a
aparecer belas. Se você está encaixando mal, as coisas começam a aparecer
feias, grosseiras, injustas e estão te perseguindo.
O exemplo
do copo com água. Se ele tem água pela metade, eu posso dizer: “ está meio
cheio” ou “ está meio vazio”.
Se eu olho
para aquilo que ele tem de plenitude, estou vendo a beleza dele. Se eu olho
para aquilo que ele tem de vazio, eu estou vendo a sua feiúra, embora o copo
seja sempre o mesmo.
Não é uma boca sequiosa,
nem
uma mão vazia que se estende,
mas
antes, um coração inflamado
e
uma alma encantada.
Ela
não é a imagem que desejais ver,
Nem
a canção que desejais ouvir, mas antes,
a
imagem que contemplais com os olhos velados
e a canção que
ouvis com os ouvidos tapados.
Você tem
de procurar a beleza dentro de você para depois reconhecê-la fora.
Hoje
existem coisas bizarras que as pessoas as classificam
de belas e as pessoas aceitam. Por que aceitam? Devem estar faltando
referencial de beleza dentro para que elas reconheçam fora. O belo reconhece o
belo. Se eu não encontro nada belo dentro de mim, como irei saber se as pessoas
estão me enganando?
Referência
interna dá trabalho. Consiste em você parar para ter aqueles momentos que
Platão chamava de “divinos ósseos” – estar com você mesmo. Procurar quem é
você, refletir, conhecer melhor a si próprio e procurar dentro de você o que
você tem de melhor e exercitá-lo na vida. As histórias dos invernos e verões da
existência. No inverno você se fecha dentro de casa; no verão você sai e
distribui aquilo que você cultivou... as sementes que você guardou no inverno.
De vez em
quando a gente tem de ter invernos da existência, entrar dentro de nós. Se recolher,
refletir...procurar conhecer a si mesmo. Procurar refletir sobre “quem eu
realmente sou”, “quem sou eu no meio dessas coisas que dizem que eu sou”. Isso
é a essência da inteligência- intelegere – escolher dentre as coisas que dizem
que eu sou; quem sou eu.
Há uma
história de um mosteiro Oriental zen. Neste mosteiro havia vários jovens e um
mestre bastante sábio. Um dia este mosteiro estava muito decadente, caindo aos
pedaços e os jovens resolveram falar com o mestre que havia de reformar, pois
senão iria desmoronar. E lá foram falar com ele.
- Mestre!
- Pois
não, jovens! O que foi?
- O Senhor
sabe, o mosteiro está caindo. O que iremos fazer? Nós não temos dinheiro. Somos
monges, pobres, vivemos da meditação. O que iremos fazer?
Ele parou,
pensou...é um bom momento para colocar esses garotos à prova.
- É
realmente, nós não temos dinheiro. Como iremos reformar este mosteiro? Já
sei...sabem aquela cidadezinha que tem aqui próxima? Aquele povoado? Vão lá e
roubem.
- Mestre,
o Senhor está brincando!
- Não!
Estou falando sério.
- Roubar?
-Roubar! O
máximo que vocês puderem.
- Roubar,
mestre?
-É a gente
precisa reformar o mosteiro. Não temos dinheiro. Só um detalhe: vocês não podem
deixar ninguém ver vocês. Porque o nome do mosteiro é que está em jogo, a
tradição de séculos. Se virem vocês, iremos ficar desmoralizados. Ninguém pode
ver vocês. Roubem, mas na condição de que ninguém esteja vendo vocês.
-Será que
o Mestre enlouqueceu? Bem, ele está dizendo... então, vamos lá para cidade roubar.
E lá se
foram os jovens todos.
De
repente, o Mestre se levanta, entra no mosteiro e ver um jovem lá, dedicado aos
seus afazeres normais, como se nada tivesse acontecido. Ele virou e falou:
- Você não
foi com os outros?
-Não,
Mestre.
Por que
você não foi, rapaz?
- É porque
eu estou obedecendo ao Senhor.
-Você está
ficando louco!!! Eu disse para roubar!
- Não.
Espere aí. O Senhor falou que seria para roubar quando não tivesse ninguém me
vendo. Eu estou me vendo o tempo todo; como eu vou roubar?
Vocês
percebem que tem vida dentro de você? Você não é ninguém. Você é alguém que está se
vendo. Se você se respeita, tem de considerar isto! Tem algo divino dentro de
você, que tem valor. Ou você não tem nada dentro, é oco? Voltado só para fora?
É ético
quando te veem, é estético quando te veem, é honesto quando te veem...olha isto
é muito relativo. Vai chegar uma hora que não terá ninguém te vendo. Você vai
fazer o quê?
Se você
não está se vendo, isto é perigoso. É tudo imposto através da coerção. Fechou a
última porta através de você, você é qualquer coisa. Isto significa dignidade humana. Existe
alguém dentro de mim e este alguém merece respeito. Se esse alguém não merece;
ninguém fora vai merecer também. Vai ser só um jogo de interesse e de
manipulação. Essa vida interior que te permite perceber o que é beleza e não
ser presa de loucuras do lado de fora.
Hoje nos
convencem de tudo. Nos convencem de que um tubarão apodrecendo é beleza; que
uma pessoa que rouba é um bom governante; que os seres humanos são todos
corruptos. Tudo isto por falta de vida interior, falta de dialogar conosco
mesmo. Ficamos vazios e robotizados, logo, o que nos disserem, acreditamos.
Então a
beleza, como qualquer outra virtude, se você não vela um pouco os olhos para
fora e não vira para dentro; não fecha os ouvidos para fora e não houve para
dentro...você não vai ter referencial externo. Você será um joguete na mão das opiniões, das circunstâncias, da moda...Você
não vai ser você. Nem hoje nem nunca. E
nunca vai saber o que é beleza.
Platão
dizia: “ a beleza é aquilo que eleva”, então não é relativo.
Nós
sabemos que o roubo não eleva; a generosidade, sim. Nós sabemos que a compaixão
eleva; o egoísmo, não. Isto não é
relativo; isto é absoluto para qualquer ser humano. Mas...nós necessitamos de
referencial interno para reconhecer isto fora, senão, caímos na moda, que é a
maior alienação que o ser humano cai. A massificação é a perda de si mesmo.
Não é a seiva
por
baixo da cortiça enrugada
nem
uma asa atacada a uma garra,
mas
sim,
um
pomar sempre em flor
e
uma multidão de anjos em voo.
Muito
poético e também uma máxima filosófica de muito valor. Pensa nesta cortiça
enrugada, na casca da árvore seca e esturricada, mas se você vai lá dentro tem
a seiva, úmida, doce que mantém a árvore viva...esta dualidade. Pensa na asa de
um pássaro, suave, cheia de plumas, mas se você se aproxima, tem aquelas garras
afiadas. Tudo no mundo é dual! Têm garras e têm plumas! Tem seiva e tem cortiça
enrugada.
A beleza
não é do mundo que fica pra lá e pra cá mudando. É do mundo onde as coisas não
oscilam. É do mundo onde as coisas são pe rmanentes,
eternas. A generosidade será sempre generosidade. A compaixão será sempre
compaixão. A fraternidade será sempre a fraternidade.
Quando
falamos em Filosofia sobre sentimentos, iremos perceber que a maior parte do
que temos na vida são emoções, porque oscilam (um pêndulo).
Os homens
mais sábios da humanidade estavam sempre serenos. Os verdadeiros sentimentos
são nobres, não oscilam: são serenos e duradouros.
As coisas
espirituais que fazem parte da essência do homem não ficam pendulando pra lá e pra cá. Elas são nobres e
duradouras. Ela é sempre a mesma coisa, sempre algo que enobrece o ser humano há
4000 anos atrás e irá enobrece-lo daqui
a 2000 anos. Vocês acham que algum dia a fraternidade irá deixar de enobrecer o
homem? A fraternidade é BELA, assim como
a HONESTIDADE.
Para
ilustrar, vamos recordar do peso do coração do morto no Egito. Quando o homem
morria, eles iam para um lugar onde a deusa Maat colocava uma pluma num prato
da balança e no outro, o coração do morto. Se o coração do morto pesasse mais do
que a pluma, ele iria para o mundo de volta; se pesasse menos, iria para terra
Jamon que eles chamavam de Ament.
O que é que
pode ter num coração para pesar menos do que uma pluma? Amor, compaixão,
valores; não tem peso nenhum. Então você vai ao mundo onde estas coisas reinam.
Agora, ama
coisas, status, objetos, reconhecimento... essas coisas pesam, logo você vai ao
mundo onde essas coisas estão.
Quanto
mais o nosso coração se torna leve, mais somos capazes de reconhecer a beleza
dentro e fora. Vamos transmutando valores de baixo por valores de cima,,, Logo,
já não somos mais enganados, como dizia Sócrates.
Um homem
muito bem intencionado, pode ser manipulado; um filósofo, não! Porque começa a
ter referenciais internos porque ele compara fora e ninguém pode levá-lo para
algum lugar. Porque ele está vendo dentro a direção. Ele compara e reconhece.
“Povo de Orphalese,
a
Beleza é a vida
quando
a vida desvela
seu
rosto sagrado.
Mas
vós sois a vida,
e
vós sois o véu...
A
beleza é a eternidade
olhando
para si mesma
num
espelho.
Mas
vós sois a eternidade...
e
vós sois o espelho!”
Você tem
duas possibilidades de consciência em você. Um é o rosto sagrado, a outra é o
véu. O véu não precisa ocultar o rosto sagrado. Às vezes é apenas para
proteger! É como uma luva. A luva não é para ocultar a mão, e sim, para protege-la
( se ela é flexível, serve à mão...).
Agora
imaginem uma luva em que os dedos fossem todos grudados. Ela não estaria protegendo
a mão, e sim, inviabilizando...
Nós temos
uma parte material (corpo) que é o nosso véu que poderia só proteger o nosso
tosto; porém se é um véu mal trabalhado, ele esconde o nosso rosto. Ele impede
que o nosso rosto enxergue alguma coisa no mundo. Que os nossos olhos vejam, que os nossos
ouvidos, ouçam e ficamos isolados do mundo. Ao invés dele nos servir, atrapalha,
porque a gente não controla; não
aprofunda; não conhece e não domina.
O mundo
manifestado é um espelho. Só que, quando
damos muita credibilidade a esses reflexos , esquecemos do rosto. É como se culpássemos o espelho por
cona das nossas espinhas.
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