sábado, 30 de novembro de 2019

PRAZER : GIBRAN


Então, um ermitão que visitava a cidade uma vez por ano acercou-se e disse:

“Fala-nos do Prazer”.

E ele respondeu, dizendo:



Lembrara que o ermitão é uma pessoa que renunciou a todos os prazeres. Ele considera o prazer como algo muito interessante, como se fosse um canto de liberdade da alma, querendo vencer os seus limites.  Só que, ele se considera que o homem se satisfaz. É como se fosse a história da escada, com o primeiro degrau e desiste de todos os demais; e o prazer tem vários níveis de prazer.  Muitas vezes, ao invés do prazer expandir, limita; ao invés de libertar, escraviza.
O prazer limitado e instintivo, não gera liberdade; muito pelo contrário, gera escravidão.
Ele vai explicar quais seriam as possibilidades do prazer. Quando você transita através dele e vai crescendo;  e não quando você se detém.
O primeiro par de sapatinhos que você calçou, não era ruim; era oque cabia no teu pé naquela época; mas será ruim você estar querendo calçar aquilo até hoje.

O primeiro grau da escada não é ruim, mas é ruim você querer se deter nele.

Lembre-se de que, quem pergunta tem a ver com aquilo que é perguntado.

Quem pergunta é um ermitão que visitava a cidade uma vez por ano.
Um ermitão, no geral é uma pessoa que renunciou a todos os prazeres e vive uma vida ascética dentro de uma caverna sem se permitir nada.
Muitas vezes em certas ocasiões da história, não em todos os casos da história, onde o prazer foi considerado um pecado: exemplo Idade Média.
Na Idade Média, os monges, algumas vezes usavam um capuz para não pegarem a brisa fresca, porque sentir prazer da brisa fresca era um pecado; então renunciavam a tudo, considerando que isso em si tem algum valor; e ele coloca isso, lógico, partindo propositalmente de um ermitãopra mostrar a nós que este tipo de radicalismo vai gerar distorções e como se lida com prazer de uma maneira humana.
Então, a renúncia ao prazer é sempre virtude?
Entregar-se ao prazer é sempre liberdade?

Oque é o prazer propriamente dito?

É só isto que consideramos como agradável:

Ou há outras possibilidades de prazeres mais agradáveis?

Ele vai se dedicar a discutir isto.

Entâo,   ele vai começar a responder:



O prazer é uma canção de liberdade,

Mas não é a liberdade.

É o desabrochar de nossos desejos,

Mas não o seu fruto.



Ou seja, num determinado momento, quando nós começamos a considerar que a roupa aperta o nosso corpo, começamos a nos considerar asfixiados na forma  de vida que vivemos; o prazer é um canto de liberdade. Eu quero espaço, então eu vou romper limites. Agora, se eu vou romper limites e vou ser capaz de conquistar um espaço maior, é outra história.

O fato de você arrombar uma porta, não significa dizer  que você é digno do que tem do outro lado, pode simplesmente se deter na violência do arrombamento e não ser digno do que está no outro aposento. Não chegar lá. Não sair do Umbral. Ficar eternamente vaidoso de ter conseguido abrir aquela porta. Então o prazer é querer expandir limite. Querer quebrar amarras, mas isso é apenas o primeiro passo. O que vem depois é o que vai determinar se isso foi um passo positivo ou não. Nós estamos num mundo dual onde as coisas podem ser positivas ou negativas, dependendo do que você vai fazer com elas.

Isso é uma das máximas da filosofia. Uma faca muito afiada: é boa ou má? Depende.

Na mão de uma boa cozinheira, é excelente. Na mão de um cidadão violento, é terrível!

O mundo manifestado, tudo é dual; logo, vamos ver o que iremos fazer com esse canto de liberdade e a partir daí,  veremos se vai te ajudar a crescer ou não.

Para Gibran as coisas são boas quando te ajudam a crescer como ser humano, caso contrário, não.





É um abismo olhando para o cume,

mas  não é o abismo nem o cume.

É o engaiolado ganhando o espaço,

Mas não é o espaço que o envolve.



Lembre-se daquela frase de Sócrates: “Só sei que nada sei.” Com certeza que você irá perceber que a medida que vão ampliando os nossos horizontes de ver as possibilidades no Universo, você vai comparar com aquele tanto que você tem e vai perceber que é uma imensidade aquilo que você não tem, perto daquilo que você tem.

Então, existe uma máxima que diz : “ o intelectual, quanto mais intelectual, mais vaidoso é; um sábio, quanto mais sábio fica, mais humilde é.”

Se para você dizer “ só sei que nada sei”, você tem de ter vislumbrado o tamanho do que não sabe. Isto é muito. Vislumbrar o tamanho do desconhecido é muita sabedoria.

Uma pessoa quando começa a perceber o Universo, ela está lá embaixo; lá no abismo e ela olha para cima e percebe a imensidão de coisas que pode ampliar sua consciência. Pode crescer, pode expandir, contanto que sua vida não precisa ser aquele roteiro repetitivo, o tanto que ela pode crescer. Mas ela ainda não cresceu. Ela simplesmente viu, então o prazer é um canto de liberdade. É um canto de querer vencer limites, mas até agora você só viu os limites, não os venceu de fato. È o engaiolado ganhando espaço, mas ainda não éo espaço que o envolve, ou seja, ele se libertou das amarras, da gaiola mas espaço ainda está todo por ser conquistado e nem levantou o primeiro voo. Na hora que ele levantar, você vai ver o quão alto ele vai ser capaz de voar e aí nós vamos julgar se ele é livre ou não. Porque se ele se liberta da gaiola e rasteja, conquistou alguma coisa...mas não tanto. E muitas vezes pode esquecer que é um pássaro, se começou a rastejar. Pode mais perder, do que ganhar.



Sim, na verdade, o prazer é uma canção de liberdade.

E de bom grado eu vos ouviria cantá-la de todo vosso coração;

Porém, não gostaria que perdêsseis

Vosso coração no canto.



Sabe o que significa isto: Um canto de liberdade que anuncia muito e usa pouco. Verdade quando você levanta voo e vai muito baixo, ou seja, ao invés de conquistar a liberdade, conquista à escravidão dos instintos, àquilo que a gente chama de libertinagem, que é a degeneração da liberdade. Onde eu saio de uma gaiola e entro em outra. Me escravizo pela falta de limites, pelos excessos, ou seja, o prazer se torna um vício.

Nós não temos um gosto tão bem formado assim para dizermos: “Tudo o que eu gosto, é bom. Tudo o que eu rejeito, é mau. Se eu ficar escravo do agradável, provavelmente não vou crescer com isso, porque o que é agradável pra mim neste momento, está longe de ser bom para um ser humano. Se eu não tiver capacidade de construir em mim asas, me entregar ao prazer, aquilo que é prazerosos para mim nesse momento, provavelmente vai me piorar, porque o meu gosto não é tão bom.

Há um filósofo indiano que dizia que a evolução nada mais é do que a depuração do gosto: aprender a gostar de coisas cada vez mais nobres e boas. Isto é levantar voos. Antes o meu prazer era só possuir coisas. Digamos que agora o prazer passa a ser conquistar a condição de ser um fator de soma na vida das pessoas. Antes o meu prazer era fazer aquilo que era agradável, agora, o meu prazer consiste em minimizar a dor das pessoas. Isto é depuração do  gosto e elevação do voo para níveis mais altos.

Agora, é um problema: porque nós consideramos que aquilo que gostamos nesse momento faz parte da nossa personalidade. Faz parte do nosso ser, mas do que da nossa personalidade. E não é verdade. É um condicionamento social.

Vocês acham que tudo que gostamos, escolhemos gostar?

Se estivesse nascido do outro lado do tempo, do outro lado do mundo, gostariam das mesmas coisas?

Percebem que a maior parte delas foram escolhidas por um condicionamento social: E tem muito pouco a ver com a sua essência:

Para você saber quem é você: mergulhar dentro de você  e se encontrar, você teria que em cada situação, cada pensamento, cada sentimento, cada coisa que você gosta; desgosta, lembrar da reflexão que você gerou, porque escolheu isto e como construiu este gosto.

Se você tentar descobrir dentro de você, cada um dos pensamentos, se são seus, você vai descobrir que não. Já temos uma clonagem social onde adotamos um pacote vida, pois a maior parte das coisas nossas, não são nossas.  Então, por que tanto apego à elas? Depurar o gosto exige que você não se identifique tanto assim com aquilo que é agradável para você, hoje. Considerando como se isso fosse parte do seu ser. Ser capaz de levantar voo, significa deixar algumas coisas para baixo.

Pense num passarinho quando ele levanta voo. Sai do seu ninho e levanta voos. Os primeiros momentos deve ser um drama . Olha para baixo; aquele ninho tão acolhedor, quentinho, tão fofinho e agradável! Isto é um drama. Mas se ele continua levantando voo verticalmente, observa uma coisinha de nada lá embaixo e o Universo à sua volta... e não vai aparecendo uma bobagem, ele ter se apegado tanto à tão pouco, e quanto mais elevado, não vai aparecendo mais insignificante?

Então, a necessidade de qualificar o gosto e conquistar prazeres mais humanos, implica em deixar algumas para trás. Lembra da lei da física: nenhum corpo pode ocupar dois lugares no espaço. Veja, se você quer crescer como ser humano, significa que você vai sair daqui  e vai pra cá, então esse lugar aqui você vai deixar pra trás. Você não pode ficar em dois lugares ao mesmo tempo. Temos de ter a capacidade de superação do que somos hoje: desindentificação.



Alguns dos vossos jovens procuram o prazer

como se fosse tudo na vida,

e são condenados e repreendidos.

Eu preferiria nem condená-los nem repreendê-los,

Mas deixa-los procurar.



Como assim? Não vamos condenar nem repreender um jovem que se entrega a prazeres grosseiros, a vícios... A coisa mais educativa que podemos fazer é sermos inspiração para aqueles que queremos influenciar qualquer pessoa que queira empurrá-lo para o vício ou pra qualquer coisa desse tipo.

Os pais sempre perguntam: o que eu faço para influenciar  bem o meu filho? – Faça com que ele te admire. Se você é uma pessoa que tem valores que ele admira, tua opinião vai ter uma ponderação muito maior do que qualquer outra pessoa.  Mas, mesmo assim, existe algo que você tem de considerar, que é o livre arbítrio. Se o ser humano necessita de uma experiência, esquece. Você pode ir ao limite das tuas experiência, esquece. Você pode ir ao limite das tuas possibilidades para dar exemplo, para dar referência, mas não pode impedir que ele a viva.

A história é escrita pela necessidade dos homens evoluírem. Eu preciso passar por ali para evoluir. A natureza vai te levar ali. Através da filosofia, o que a humanidade inventou? A filosofia é um experimento que nasceu pouco depois dos homens. É difícil você saber quando o homem começou a questionar o sentido da vida?

Deve ter sido muito pouco tempo depois que eles começaram a subir como homem. A filosofia faz com que você possa aprender não através da vivência mas através da vivência.

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