Ailton Krenak é um dos autores mais lidos nos últimos anos e em conjunto com o Ciclo de Estudos Selvagem produziu a websérie A Flecha Selvagem.
São seis filmes curtinhos, de 15 minutos cada, que misturam de forma muito apropriada e de fácil compreensão conhecimentos das tradições dos povos originários e conhecimentos científicos. As “flechas” reúnem trechos das rodas de conversa dos eventos Ciclo de Estudos Selvagem realizados nos anos de 2018 e 2019 e dos bate-papos online de 2020 e 2021, resgatando pensamentos e reflexões sob as perspectivas científicas, mitológicas e ancestrais.
O primeiro episódio – A SERPENTE E A CANOA - já está no canal do YouTube do Selvagem – Ciclo de Estudos
Trata-se de uma viagem por teorias científicas contemporâneas e memórias das culturas ancestrais de várias partes do mundo. O fio condutor deste episódio costura duas narrativas: a da canoa cobra, memória originária de povos rio negrinhos da Amazônia, e a serpente cósmica, presente em mitos de origem de diferentes culturas, vista como a dupla hélice do DNA, código de memória presente em tudo que é vivo. A viagem percorre uma sequência que entrelaça saberes indígenas e hipóteses científicas sobre o surgimento da vida.
MAIS CINCO FLECHAS
As outras cinco flechas serão lançadas até dezembro. A websérie é composta por uma narrativa na voz do líder indígena, tem narração inicial da artista Daiara Tukano e exibe obras de artistas brasileiros (entre eles, indígenas) e estrangeiros.
A Flecha Selvagem é a realização de um sonho de Krenak para “adiar o fim do mundo”. Foi a solução que ele encontrou para que o conteúdo desses encontros fosse mais bem aproveitado, reaproveitado, reciclado, e pudesse promover novas reflexões
Para além de atingir o público em geral, os organizadores fazem “um convite para que escolas, universidades, pontos de cultura e projetos comunitários de educação acessem narrativas mais pluriversais”. Para isso, cada flecha/vídeo será acompanhada/o por um Caderno Selvagem que terá download gratuito. Será uma publicação especial com informações complementares, com propostas de atividades e outras ativações.
Veja o resumo de cada um dos episódios:
SERPENTE CÓSMICA
“Viajaremos por teorias de criação do Cosmos ao surgimento da vida na Terra a bordo de narrativas científicas contemporâneas e das memórias das culturas ancestrais e tradicionais. O fio condutor deste episódio será a Serpente Cósmica, presente em mitos de origem de diferentes culturas, vista como a dupla hélice do DNA, código de memória presente em tudo que é vivo. A viagem percorrerá uma sequência entremeada de mitos de origens e hipóteses científicas sobre o surgimento da Vida.
PLANTAS MESTRAS
Aqui, o conhecimento tradicional nativo conversa com Paracelso, Darwin, Lineu e Lynn Margulis. Pensar que há um domínio das plantas, responsáveis pela fotossíntese, que transforma energia solar em matéria. Pode-se dizer que a memória está inscrita na natureza através dos genomas. E assim, de mãos dadas com diferentes linhagens de botânicos, raizeiros e pajés, caminharemos entre as plantas mestras, agentes da pluriversalidade, para perceber a profundidade da nossa conexão com a biosfera.
BIOSFERA
Gaia, a Biosfera, é um grande organismo vivo do qual todos fazemos parte. Para além do Antropoceno, uma visão da Vida onde tudo está absolutamente relacionado, das cianobactérias ao ozônio. Ver a fotossíntese como chave de manutenção do equilíbrio dinâmico e dessa forma perceber a importância da matéria verde para a regulação da biosfera. Falaremos de raios cósmicos, frequências de luz, energia química e outros processos. A Teoria de Gaia, aqui, dialogará com o céu suspenso, como descrito por Davi Kopenawa.
SERES INVÍSIVEIS
Os seres invisíveis são essenciais para a vida. A ciência os revela como contínuas atividades de plânctons, fungos, vírus, bactérias e diatomáceas que regulam da Biosfera. Mergulharemos no conceito da simbiose, mecanismo de evolução a partir da cooperação e não da competição, aprofundando-nos, assim, nas relações entre os seres e também nas soluções que outros organismos encontraram para questões como, por exemplo, a geração de resíduos. Na visão indígena, os seres invisíveis encontram outra metafísica: os grafismos como visualidade da ordem energética da vida, gente-peixe, gente-pedra, gente-planta, os “espíritos” da mata, os “donos” dos lugares. Eles também habitarão esta flecha.
METAMORFOSES
A metamorfose como expressão do processo de transformação contínua da vida. O filósofo Emanuele Coccia diz que a vida é uma migração entre corposonde cada ser vivo é uma espécie de casulo pelo qual a vida constrói algo diferente. Com essa inspiração, construiremos uma ponte entre a narrativa de Coccia e conceitos indígenas como shuku shukuê que, para os Huni Kuin, representa “a vida não tem fim”.
REGENERANTES
“Micróbios, vegetais, animais, fungos, elementos orgânicos e inorgânicos se relacionam a centenas de milhões de anos de forma equilibrada e dinâmica. Os humanos tornaram-se uma força geológica capaz de afetar a estrutura sensível que sustenta a biosfera. O ecólogo Fabio Scarano fala de espécies que atuam como células-tronco na atividade de retecimento da camada viva do planeta. Dessa proposição buscaremos alinhar no front da batalha pela vida, do encantamento pela vida, algumas atividades que transformam de forma positiva o sistema insustentável em que vivemos. Quem são os seres regenerantes que podem colaborar para cicatrizar a ferida antropocênica? Falaremos sobre a revegetalização do planeta, como dizia o pajé Agostinho Ika Muru do povo Huni Kuin, e outros comandos de regulação para além dos humanos”.
SOBRE AILTON KRENAK
O índio nascido em 1953 na região do Médio Rio Doce, em Minas Gerais, foi alfabetizado somente aos 17 anos. Em 2016 Ailton Krenak receberia o título de Professor Doutor Honoris Causa, pela Universidade Federal de Juiz de Fora (SP), onde ele também lecionava em cursos de especialização sobre temas indígenas.
Em 2020 foi escolhido para receber o importante Prêmio Juca Pato de Intelectual do Ano.
O líder indígena ambientalista participou, na década de 1980, da fundação da União dos Povos Indígenas e da Aliança dos Povos da Floresta, bem como da Assembleia Nacional Constituinte que elaborou a Constituição Brasileira de 1988.
Ali protagonizou uma cena marcante que ganhou o mundo. Em discurso, na tribuna da Câmara dos Deputados, pintou o rosto com tinta preta do jenipapo, segundo o tradicional costume indígena brasileiro, para protestar contra o que considerava um retrocesso na luta pelos direitos dos índios brasileiros.
Desde 2015 vem denunciando o crime socioambiental ocorrido em Mariana (MG), com o rompimento da barragem do Fundão, da mineradora Samarco/BHP Billiton, da Vale que impactou também o território tradicional dos índios krenak.
Ailton Krenak transmite suas ideias de forma oral, conforme a tradição indígena milenar.